Pesquisadores da Embrapa Cerrados (DF) verificaram que vacas Gir Leiteiro que tiveram acesso a áreas com sombra de eucalipto produziram quatro vezes mais embriões durante o período mais quente do ano e, ao longo do período do estudo (33 meses), 22% a mais de leite. A comprovação reforça a importância de oferecer aos animais condições confortáveis para o bom desempenho reprodutivo. Os resultados também estimulam a uso dos sistemas integrados com floresta, pois mantêm árvores nas pastagens.
De janeiro de 2017 a setembro de 2019, especialistas de diferentes áreas da Embrapa e da Universidade de Brasília (UnB) se dedicaram ao projeto “Conforto térmico, produtividade de leite e desempenho reprodutivo de vacas de raças zebuínas em sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) no Cerrado”.
“Identificamos que o uso da ILPF com vacas zebuínas leiteiras pode ser recomendado, pois além de aumentar a produtividade de leite e a quantidade de embriões produzidos, também melhora a qualidade do produto e do pasto, o valor nutritivo da forragem e os parâmetros fisiológicos e comportamentais das vacas”, afirma a pesquisadora Isabel Ferreira, líder do projeto.
Mais leite de melhor qualidade
Os estudos foram conduzidos no Centro de Tecnologia de Raças Zebuínas Leiteiras (CTZL), localizado na região administrativa do Recanto das Emas (DF) e ligado à Embrapa Cerrados. Durante os 33 meses de experimento, os especialistas mediram o desempenho produtivo e reprodutivo de vacas Gir Leiteiro a pasto com a presença e ausência de sombra.
Eles observaram que em dias quentes os animais têm estresse por calor, o que compromete a produção e a composição do leite, a reprodução, a temperatura superficial e o comportamento ingestivo (ingestão, ruminação e repouso). A pesquisa identificou que o ambiente sombreado reduziu a temperatura da superfície corporal das vacas em diferentes pontos em até 3%.
Além de aumentarem a produção de leite, as vacas Gir Leiteiro que tiveram acesso às áreas com sombra de árvores de eucalipto proporcionada pelo sistema Integração Lavoura-Pecuária-Floresta também melhoraram a qualidade do produto, com 6% a mais de extrato seco desengordurado (extrato seco total, menos o teor de gordura), quando comparado ao que foi produzido pelos animais submetidos a pleno sol.
“A presença das árvores melhora a rentabilidade do produtor de leite, tanto por causa do aumento da quantidade do produto, quanto pela possibilidade de melhor remuneração dos sólidos totais pelos laticínios e pela venda da madeira para diferentes usos”, enfatiza a especialista.
Estresse térmico: o mal que o calor em excesso faz aos animais
O estresse térmico ocorre quando o calor produzido pela vaca e aquele absorvido do ambiente são maiores que a capacidade do animal de perder calor. O bovino perde calor pela superfície da pele e pelo trato respiratório. Quando fica estressado por causa disso, o animal sofre alterações fisiológicas para diminuir o calor: fica ofegante e aumenta a frequência respiratória, a temperatura corporal, a ingestão de água, a salivação e a quantidade de suor.
A inserção das árvores no sistema de produção é um dos recursos que podem ser utilizados pelos produtores para diminuir as causas desse estresse térmico, já que além de bloquear a radiação solar, as árvores reduzem a temperatura e aumentam a umidade do ar.
Quatro vezes mais embriões
Esse ambiente específico proporcionado pela sombra e a consequente diminuição da temperatura corporal dos animais impactou também na melhoria dos índices de reprodução dessas vacas em relação aos animais que estavam expostos ao sol.
“Os animais que ficaram à sombra também produziram 16% mais folículos na superfície dos seus ovários, e 75% a mais de ovócitos totais foram recuperados pela aspiração folicular. O número de ovócitos viáveis aumentou em 81%, e o de embriões em quatro vezes. Consideramos uma diferença bastante importante”, afirma o pesquisador Carlos Frederico Martins.
Outro fator relevante identificado pelos especialistas foi que, com a sombra, o tempo de ruminação dos animais aumentou em 32%. Segundo Isabel Ferreira, essa elevação é desejável, pois quanto mais tempo o animal fica ruminando, mais ele divide as partículas de forragem e as deixam expostas para a fermentação animal.
“Além disso, produzir mais saliva tem um efeito tampão no rúmen, o que favorece a digestão das fibras e disponibiliza mais nutrientes aos animais”, explica.
Árvores também beneficiam a pastagem
Os pesquisadores identificaram, ainda, que a qualidade da forragem também é impactada pela presença das árvores no pasto. A proteína bruta do capim no pasto com árvores foi 30% superior quando comparada à do capim do pasto solteiro, e a digestibilidade in vitro do capim sombreado foi 6% superior. Isso se deve principalmente, segundo os especialistas, à intensificação da degradação da matéria orgânica e da reciclagem de nitrogênio no solo sob influência do sombreamento e ao prolongamento do período juvenil da planta forrageira, o que permite maior tempo para a manutenção de níveis metabólicos mais elevados e, consequentemente, dos nutrientes disponíveis aos animais pelo pastejo.
Integração como alternativa sustentável de produção
Há alguns anos, a ideia de plantar árvores em áreas de pastagem poderia ser considerada fora de propósito. Atualmente, essa integração se mostra cada vez mais uma alternativa sustentável de produção agrícola. A adoção da tecnologia Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, em seus diferentes arranjos, cresce no Brasil cerca de 10% ao ano. Um dos benefícios do componente florestal no sistema ILPF, além da utilização da madeira para diversos fins, é oferecer conforto térmico aos animais devido à sombra proporcionada pelas árvores. De acordo com estudos conduzidos pela Embrapa, essa arborização produz diversos impactos positivos na produtividade dos animais.
Principais resultados obtidos com vacas Gir Leiteiro no CTZL em pastagem sombreada
Também participaram da pesquisa Álvaro Fonseca Neto, Artur Muller, Fernando Macena, Gustavo Braga, Heidi Cumpa, Juliana Caldas, Karina Pulrolnik, Roberto Guimarães e Sebastião Pedro, além da professora da UnB Concepta McManus.
Fonte: Embrapa