Quando a produção é maior que a demanda, os preços tendem a não rentabilizar como deveriam. No Rio Grande do Sul, a produção de trigo chega a 2 milhões de toneladas por ano, enquanto o consumo se mantém estável em um milhão de toneladas. Óbvio que isso não traz o retorno econômico esperado pelo produtor. É justamente por isso que a Embrapa Trigo e a Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul (Fecoagro/RS) estão trabalhando no desenvolvimento e validação de um sistema de produção de trigo destinado à exportação.
A ideia é reduzir o risco da cultura, por conta das instabilidades climáticas e garantir um maior retorno econômico possível ao produtor. A base do projeto é a redução de custos no trigo para tornar o produto mais competitivo no mercado externo.
“Como a lavoura de trigo tem um nível de incerteza maior do que as culturas de verão, o planejamento é fundamental para aliar rendimento à rentabilidade”, afirma o pesquisador da Embrapa Trigo, João Leonardo Pires.
Segundo ele, o trigo exige um mínimo de tecnologia para ser produzido, mas práticas promotoras e protetoras da lavoura precisam ser avaliadas de acordo com o retorno econômico que proporcionam. Afinal a produtividade nem sempre se traduz em lucro no trigo, enquanto que rendimentos acima da média geralmente são resultado do alto investimento em insumos.
“É importante manter um equilíbrio das contas agora, na implantação da lavoura. Muitas vezes é mais vantajoso para o produtor assumir um teto de rendimento menor, mas com boa rentabilidade”, diz Pires.
Problemas a serem contornados
O projeto detectou alguns entraves que atrapalham os produtores, como a calendarização de aplicações nas lavouras, que tem tornado o controle de pragas e doenças em uma receita única, contrária às boas práticas agrícolas e onerando o custo da lavoura. Somente os fungicidas representam de 8% a 12% do custo total no trigo.
“Muitas cultivares têm boa resistência a doenças e poderiam manter o nível de rendimento de grãos mesmo com o uso mais racional de fungicidas. O que temos visto são aplicações calendarizadas, nem sempre necessárias”, conta Pires.
Da mesma forma é o uso de fertilizantes, que representam outros 33% do custo da lavoura, e nem sempre conta com critério agronômico para definir o investimento. Em alguns locais avaliados pela Embrapa Trigo, a densidade de semeadura variou de 200 a 500 sementes por metro quadrado, grande diferença nos custos de produção que ao final resultou no mesmo rendimento.
Solução
Em busca de alternativas, a Embrapa Trigo e a Fecoagro/RS articularam uma rede de validação do sistema de trigo para exportação, envolvendo cooperativas no Rio Grande do Sul: Coopatrigo (São Luiz Gonzaga), Cotricampo (Campo Novo), Cotrirosa (Santa Rosa) e Cotripal (Panambi); além da Embrapa Trigo (Coxilha).
Em cada local, foi verificado o manejo (insumos e práticas culturais) usado pela maioria dos produtores de trigo e definidos ajustes em práticas como adubação de semeadura e cobertura, densidade de semeadura e uso de defensivos. Também, foi testada a substituição da cultivar em uso na região por material com características de potencial produtivo, rusticidade e qualidade tecnológica mais apropriada para o sistema de trigo exportação.
Os resultados das validações em cada cooperativa demonstraram que os ajustes no manejo e em escolha de cultivares com foco no sistema para exportação permitiram redução de custos entre 18% a 24%, com manutenção dos níveis de rendimento de grãos. Além disso, na maioria das situações, mesmo em safra desfavorável, os ajustes realizados com foco no trigo exportação aumentaram a receita líquida ou reduziram as perdas em relação ao sistema utilizado tradicionalmente.
Do ponto de vista de qualidade tecnológica, na maioria das situações, os parâmetros obtidos foram compatíveis com as exigências para exportação, com valores superiores a peso do hectolitro 78, número de queda acima de 300, teor de proteínas totais nos grãos acima de 12% e força de glúten com valores em faixa aceitável para exportação (que caracterizam trigos das classes comerciais Básico ou Doméstico).
“Os resultados indicam que a validação proposta permitiu verificar a compatibilidade dos sistemas com a redução de custos mantendo o potencial produtivo em níveis elevados e com a qualidade tecnológica demandada pelo mercado externo”, explica o pesquisador João Leonardo Pires.
Fonte: Canal Rural