Embora admitam que os impactos da reforma trabalhista ainda são quase invisíveis nos campos do Rio Grande do Sul, produtores, trabalhadores, sindicalistas e técnicos prevêem algumas mudanças para quando a colheita se intensificar. O assessor jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar), Carlos Eduardo Chaves da Silva, diz que ainda não ocorreram grandes negociações desde novembro, mas percebe um endurecimento da classe patronal, uma falta de interesse para negociar. Ele acredita que a influência da mudança sobre os contratos vai aparecer mais fortemente nos meses de fevereiro, março e abril e dar um panorama da transformação.
A reforma terminou com a contribuição sindical obrigatória, o que, segundo Silva, deixará parte das entidades sem condições de se manter. Mas o assessor jurídico da Contag entende que o impacto da dispensa dos sindicatos para homologação de rescisões é maior ainda.
“Isso afasta de vez o produtor”, avalia. Apesar disso, Silva percebe que ainda há empregadores que, mesmo sem a obrigação, acabam fazendo as rescisões nos sindicatos. “É um clima de espera. Ninguém tem toda a certeza das mudanças. Inclusive o trabalhador, que não percebe no dia a dia as mudanças”, comenta.
O produtor Pedro Primo Paulo Barili, de 78 anos, de Santa Rosa, diz que em 40 anos de atividade agrícola nunca foi tão fácil contratar. Ele emprega 15 funcionários distribuídos em duas propriedades. Três estão em uma delas, na localidade de Campo da Aviação, em Santa Rosa, onde há cultivo de soja, trigo e milho e criação gado. Outros 12 estão na fazenda que produz soja e milho no Piauí.
“Ainda não tivemos movimentação de funcionários desde que a reforma entrou em vigor, pois ainda não se iniciaram os períodos de maior demanda de trabalho, que deve chegar em alguns meses, para a colheita da soja”, reconhece Barili. “Mas o grande mérito da reforma foi retirar muito da burocracia estatal”, destaca. O produtor acredita que a liberdade na negociação com os sindicatos traz mais segurança para os empregadores, e facilita as contratações. “Os casos começam a se regionalizar”, observa. “No tratamento caso a caso, as situações conseguem ser adaptadas.”
Barili, que também é advogado, entende que as convenções foram consolidadas pela nova legislação.
“A reforma serve para os dois lados sem causar prejuízos salariais”, afirma.
Segundo o produtor, as possibilidades de acordos, os períodos de 10 a 12 horas sem interrupção da jornada, para evitar perdas na produção, com compensação no mesmo mês, são benefícios para os empregadores. No mesmo raciocínio, Barili enumera como vantagens para o empregado a possibilidade de, nos períodos de compensação, poder buscar outras atividades e, em casos de rescisão contratual, ter ganhos relacionados ao fundo de garantia, que não existiam antes.
“A reforma traz benefícios para o trabalhador e uma segurança para o empregador”, afirma. Além disso, o produtor lembra que no campo é muito comum a oferta de bonificações para os trabalhadores rurais, com sacas de soja, por exemplo. “Agora essas bonificações são permitidas, sem uma relação salarial”, ressalta.
Outro aspecto destacado por Barili refere-se à maior facilidade que as partes terão para desenvolver suas atividades dentro das formalidades legais.
“Agora pequenos empregadores também podem manter tudo regularizado, não sai mais tão caro”, acredita.
Para o produtor e advogado, a resistência inicial de ambas as partes à reforma é normal. Além disso, Barili entende que a lei ainda pode ter evoluções e facilitar ainda mais as contratações.
Contratantes e empregados esperam pela segurança jurídica
Os sindicatos de trabalhadores e patronais admitem que o uso das novas regras contratuais ainda não deslanchou, mas divergem quando tratam das consequências das mudanças. A Federação dos Trabalhadores (as) Assalariados Rurais no Rio Grande do Sul (Fetar-RS) entende que a nova legislação gerou uma instabilidade jurídica no campo, além de prejudicar, em alguns pontos, os trabalhadores e os próprios sindicatos (com o fim da contribuição obrigatória).
Mas, por outro lado, avalia que as regras fizeram com que empregadores se aproximassem, fortalecendo também as convenções coletivas. Para a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), a reforma reduziu as reclamatórias trabalhistas.
O presidente da Fetar-RS, Nelson Wind, acredita que a lei não é clara e, por isso, a reforma não se aplica por inteiro. Para o dirigente, existe uma compreensão por parte dos empregadores e, por isso, o que vale no campo são convenções.
“Muitos empregadores têm este bom senso e estão procurando os sindicatos de trabalhadores”, revela.
Wind diz que a federação percebe que muitos empregadores evitam implementar as mudanças enquanto esperam pela segurança jurídica do ato.
Por outro lado, Nestor Hein, diretor jurídico da Farsul, sustenta que as mudanças da reforma trabalhista já são percebidas nas contratações de mão de obra no campo. Apesar de não ter números que comprovem o impacto, o advogado cita uma percepção no campo jurídico que mostraria as boas consequências da reforma.
“Houve uma diminuição no número de reclamatórios trabalhistas e, nas que foram ajuizadas, há maior rigor nos critérios utilizados”, observa.
Hein acredita que há um cuidado maior por parte dos advogados que promovem ações trabalhistas.
Diante das dúvidas que a reforma suscitou, a Farsul passou a oferecer um serviço de consultoria gratuito para produtores se sentirem seguros no momento de contratar.
“Todos querem ser criteriosos para aplicar a legislação”, ressalta Hein. “Há algumas resistências em aceitar algumas mudanças da reforma. E isso é uma constatação”, afirma, referindo-se à posição manifestada por alguns juízes e desembargadores da Justiça do Trabalho.
Fonte: Correio do Povo