A redução no volume de chuvas nos últimos anos, em especial no Sudeste, tem provocado estragos e apreensão. Agricultores que perderam boa parte da última safra e não conseguiram quitar o financiamento bancário estampam uma das faces mais cruéis da crise, mas não a única. Pecuaristas que viram, angustiados, pequenos cursos d’água que abasteciam suas propriedades definhar, passaram apuros para matar a sede dos animais. A saída foi buscar alternativas. Uma das mais bem-sucedidas é a recuperação de nascentes.
O produtor Alcides Borges de Oliveira, da Estância Garrafinha, em Capelinha do Barreiro, bairro rural distante 25 km de Uberaba, MG, sofreu com a estiagem.
- Nos últimos dois anos, a situação se agravou tanto que deixei de usar alguns piquetes porque não tinha água para os bebedouros- conta Oliveira.
Ele engorda 200 novilhas meio-sangue por ano.
- Fiz bolsões para reter a água da chuva, mas não adiantou. A solução surgiu em um ciclo de palestras sobre recuperação de nascentes promovido pelo Sindicato Rural de Uberaba – conta o produtor.
A propriedade de Oliveira foi uma das escolhidas para a demonstração a campo da técnica, conduzida por Pedro Josino Diesel, técnico da Cooperativa Agroindustrial de Cascavel (Coopavel), no Paraná, especialista em recuperação de nascentes. A água da nascente chega por gravidade a um reservatório ao lado do confinamento.
- São 3.500 litros por dia, suficientes para manter cem animais – afirma ele.
Nascentes ou minas d’água são pequenas aberturas na superfície do solo por onde a água aflora. São “pontos de descarga” dos aquíferos, que armazenam água subterrânea.
No meio rural, a água que brota das nascentes alimenta açudes ou represas, dando suporte à irrigação de culturas agrícolas, ao mesmo tempo em que abastece reservatórios utilizados para dessedentação dos animais.
Em muitos casos, no entanto, a água das nascentes fica “perdida”, estancada em terrenos brejosos, onde acaba desperdiçada.
- A água é como a circulação do nosso sangue, não pode ficar parada – compara Diesel.
Para o técnico, é um equívoco sentenciar que toda área onde exista uma nascente, normalmente situada nas conhecidas APPs (áreas de preservação ambiental), deve ficar intocada. Às vezes, elas exigem intervenção humana.
Por exemplo, quando ficam abaixo de áreas agrícolas onde não foram feitos tratos culturais adequados, como terraceamento ou curvas de nível, que minimizam a erosão. Como consequência, os olhos d’água são “entupidos” por sedimentos trazidos pelas enxurradas, assoreando as nascentes. Sem ter para onde “correr”, a água empoçada transforma o terreno num extenso lamaçal.
- Nestes casos e em outros específicos, deve haver intervenção do homem, inclusive para o futuro das áreas de preservação permanente. Só plantar árvores em APP não resolve o problema da falta de água. É preciso abrir caminho para que ela chegue a seu destino e abasteça os mananciais – afirma o técnico.
Ciente de que se trata de um tema espinhoso, por envolver a legislação ambiental, Diesel tem procurado convidar representantes de órgãos ambientais e até mesmo do Ministério Público para participar dos encontros que promove com produtores rurais para ensinar a técnica de recuperação de nascentes.
Simples e fácil de fazer
Recuperar uma mina d’água é tarefa até que simples e que custa pouco, pois requer materiais baratos: pedaços de canos de PVC, mangueiras de borracha e cimento. Para que a empreitada
seja bem-sucedida, no entanto, é preciso seguir à risca um roteiro de tarefas. Em primeiro lugar, é obrigatório fazer o procedimento no auge da estação seca, que está no início este ano. Em segundo lugar, deve-se desassorear a nascente. Após a delimitação da área, definida pelos “pontos de descarga” da água que aflora, inicia-se o trabalho de limpeza da superfície com a retirada da terra e matéria orgânica. Na sequência, com o auxílio de ferramentas como enxadão e pá, remove-se a lama até encontrar o chão firme.
Com as mãos, desobstruem-se os olhos d’água, que normalmente brotam de orifícios argilosos. Ao mesmo tempo, abre-se uma vala, ligando a nascente até o destino do curso d’água.
Fonte: Portal DBO