A colheita da safra 2017/2018 de algodão segue em marcha acelerada no Brasil e a expectativa dos produtores é de um novo recorde na produção nacional, de 2,015 milhões de toneladas de algodão em pluma, ante a marca alcançada em 2011, de 1,959 milhão de toneladas. Outro marco esperado para a cotonicultura brasileira, em 2018, é a escalada de uma posição no ranking dos maiores exportadores mundiais, superando a Austrália, e ficando atrás apenas dos Estados Unidos e Índia.
De julho deste ano até junho de 2019, a previsão de embarques de pluma para exportação é de 1,170 milhões de toneladas, considerando a produção nacional esperada pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa). Os números foram divulgados durante a reunião da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Algodão e Derivados, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), ocorrida na última sexta-feira (22), durante a programação do XVII Anea Cotton Dinner, tradicional encontro promovido pelos Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), na ilha de Comandatuba, na região Sul da Bahia.
De acordo com o presidente da Abrapa, Arlindo de Azevedo Moura, o crescimento da área plantada de 26% e a produtividade em torno de 1,7 mil quilos de pluma por hectare respondem pelo aumento de produção também na ordem de 26%. “Nesses últimos dois anos, a produção cresceu quase 60% e o primeiro levantamento da safra 2018/2019 já indica um crescimento na intenção de plantio de cerca de 12,5%, elevando a área plantada com algodão para 1,330 mil hectares. Se o clima ajudar e a produtividade se mantiver em linha com o que alcançamos na safra 2016/2017, o país poderá colher, na próxima safra, 2,26 milhões de toneladas de pluma”, antecipa Moura.
O crescimento de dois dígitos ao ano na área plantada deve continuar e reflete, segundo o presidente da Abrapa, o reconhecimento alcançado pelo algodão brasileiro no mercado internacional. “Hoje temos um produto que se equipara em qualidade ao dos Estados Unidos – que detém 40% das exportações – e muito próximo do australiano, considerado o melhor em qualidade, graças ao clima ‘controlável’ que a irrigação em 100% da área garante àquele país”, explica. No Brasil, as condições naturais do cerrado, que permitem o plantio na estação das chuvas e a colheita na seca, favorecem a produção em regime de sequeiro, com uso da irrigação em apenas 4% da área total de lavouras. “Ainda assim, alcançamos excelência na qualidade, com o bônus de termos uma produção sustentável, tanto ambiental quanto economicamente falando, porque a energia elétrica, que seria necessária para mover os pivôs, é muito cara”, afirma.
Exportações
Para o presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), Henrique Snitcovski, o avanço sobre a posição da Austrália no ranking de exportadores, ainda nesta safra, é um marco importante do país, e a expectativa é de que, já na safra 2018/2019, o Brasil se encaixe como segundo maior exportador mundial. “Isso aumentará a sua participação e presença no mercado global e fortalecerá o país como fornecedor nos principais mercados consumidores, uma vez que terá à frente apenas os Estados Unidos, que respondem por 40% das exportações de algodão no comércio mundial”, afirma.
A guerra comercial entre Estados Unidos e China reflete no algodão brasileiro, diz Snitcovski, sobretudo, na volatilidade do mercado, por conta da incerteza criada pela tensão entre os dois países. “É fato que a China deixou de ser o maior importador de algodão, sendo substituída por Bangladesh e Vietnã, mas, já na temporada 2018/2019, volta com a previsão de se posicionar como um dos maiores importadores, com a redução dos estoques de reserva e manutenção da necessidade de suprir o déficit entre produção e consumo. Precisamos acompanhar muito de perto o que vai acontecer, e o que vai nos favorecer ou não, uma vez que se tratam de dois grandes players”, pondera. Ele acredita que, para o Brasil, com uma produção maior, será uma oportunidade de o país voltar a crescer em fornecimento de algodão para a China. “Apesar da volatilidade, o mercado depois vai se ajustar e, consequentemente, a participação dos países exportadores, em cada mercado consumidor”, prevê.
Indústria em alerta: Abit revê os números do setor
O clima de otimismo que marcava a indústria, representada na Câmara Setorial do Algodão e Derivados pela Associação Nacional da Indústria Têxtil e de Confecções (Abit), diminuiu em relação à reunião anterior, realizada no início abril. A Abit reviu a estimativa de crescimento do setor, que na ocasião era de 3,5% para o segmento de confecção, de 4 a 4,1% para a indústria têxtil, com geração de 16 a 20 mil postos formais de trabalho. “Revisamos nossos números. No vestuário, hoje, a perspectiva de aumento de produção é de 1, 2% e de 2,9% nos têxteis. No início do ano, nossa expectativa de crescimento de varejo era de 5% e hoje é de quase a metade disso”, revela o presidente da Abit, Fernando Pimentel.
“O que vai acontecer adiante definirá muito o que poderemos gerar de números positivos. Saímos em 2015/2016 de muita recessão, e, no ano passado, conseguimos recuperar a produção, o número de empregos e o varejo, que cresceu mais de 7%, e a indústria apresentou uma performance bastante razoável”, lembra Pimentel.
A chegada tardia e menos intensa do frio também atrapalhou os planos do setor industrial, impactando na venda das coleções de inverno. “A verdade é que o consumidor deu preferência aos itens que ele havia deixado de consumir na recessão. Venderam-se mais os bens duráveis que os não duráveis ou semiduráveis, como é o nosso caso. De tal forma que, no início desse ano, de janeiro a abril, nós tivemos uma queda de 3,1% no consumo de vestuário no país. A produção têxtil ainda cresceu”, disse.
A indústria, segundo Fernando Pimentel, investiu em máquinas e equipamentos comprados no exterior, principalmente, voltados para a flexibilidade, produtividade e sustentabilidade, mas não tanto para aumentar a produção. “Nossas exportações de têxteis e vestuários caem, mas esperamos chegar ao final do ano com leve crescimento de 1%, e as importações continuam nos afetando muito, com esse varejo menor e as importações crescendo mais de 30% no vestuário. São baques muito fortes na produção nacional”, lamenta.
Com relação a preço, Pimentel afirma ser “dramático” o quadro, por conta do aumento no custo dos insumos. “Nos últimos 12 meses, o algodão subiu mais de 40% e o índice de preços nas fabricas é extremamente baixo. Têxteis subiram 3,35% no período, e a confecção em registra deflação. Há uma pressão de margens violenta sobre a indústria e a capacidade de recompô-las nos preços depende da capacidade de repasse ao consumidor, e não há espaço para isso hoje”, diz. O descasamento entre o dólar e o preço dos insumos também afeta o quadro operacional das companhias, segundo Pimentel, destacando que estes últimos cresceram em torno de 46%, por conta da alta no preço da matéria-prima e da energia.
Durante a reunião da Câmara Setorial, a Abrapa apresentou para a Abit o monitoramento da colheita e do beneficiamento, que vem sendo executado pela entidade semanalmente. O levantamento tem como objetivo abastecer de informações o setor industrial que, em janeiro, temia um possível desabastecimento de algodão na entressafra. “Por tudo que estamos vendo até agora, não há o que temer”, afirma Arlindo Moura.
Greve dos caminhoneiros
Segundo pesquisas da Abit entre seus associados, a greve dos caminhoneiros representou uma perda de quatro dias integrais de produção, dentre os nove dias completos de greve. “Ainda não sabemos o quadro final, porque essa questão ainda não está resolvida. Quatro dias de produção significam, com impostos, um faturamento de R$2,5 bilhões, que não serão recuperados”, diz.
Os produtores de algodão também sentem o impacto da greve dos caminhoneiros, especialmente, pela ameaça de tabelamento do frete, tema que ainda não está resolvido, segundo o presidente da Abrapa. A associação que, nos primeiros dias da greve, apoiou a demanda por mudanças na política de preço dos combustíveis da Petrobras, manifestou-se contrária ao movimento em seguida, com os impactos da paralização sobre o abastecimento do país e a demanda do setor pelo tabelamento. Para Arlindo Moura, da Abrapa, isso representa um retrocesso de 30 anos na economia brasileira “e não deveria ter sido sequer aventado e muito menos acatado”, concluiu.