"O sinergismo entre a sucessão trigo-soja é interessante pois a soja amplia a produtividade em até 500 kg/ha, muito devido a maior “janela” para o manejo de plantas daninhas na soja que quando em sucessão ao milho em 10 dias após a emergência já causam redução de 5% na produtividade de grãos."

PORQUE NÃO DEVEMOS DESISTIR DO TRIGO

Historicamente, produzir trigo no Brasil de forma competitiva sustentável tem sido um dos principalmente desavios de nossa agricultura. O Rio Grande do Sul (RS) é o segundo maior produtor nacional de trigo – por vezes, intercalando o primeiro lugar no ranking com o Paraná, mas no ano de 2014 o RS teve um dos seus piores cenários na produção do trigo, onde ocorreu uma queda de 52,3% da produção, 56,5% da produtividade e 71% das exportações em ralação à safra anterior. A safra de trigo de 2014 passou por problemas climáticos que teve como consequência excesso de umidade agravando a ação de fungos como brusone (Pyricularia grisea), giberela (Gibberella zeae) e bacterioses nas plantas. As perspectivas para a safra de trigo 2015 não são muito promissoras, como algumas causas pode-se citar a frustração da safra passada, previsões de El Niño, custo de produção maior devido à alta do dólar. O primeiro levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a safra do cereal apontou recuo de 10%, com 1,02 milhão de hectares, o primeiro mapeamento feito pela Emater indicou redução de 19,88% na área, inferior a 1 milhão de hectares, esses dados justificam a redução na venda de fertilizantes (no último levantamento, a Emater subiu esse percentual para quase 24%). Segundo dados divulgados pela Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA), o volume de fertilizantes entregue aos produtores em abril foi 20,9% menor na comparação com o mesmo mês de 2014. As vendas atingiram 1,388 milhão de toneladas, ante 1,755 milhão de toneladas em abril do ano passado. No acumulado do ano, o volume também é negativo, com 6,982 milhões de toneladas, 8,7% menos que as 7,646 milhões de toneladas entregues de janeiro a abril do ano passado. Apesar do Brasil comprar no mercado externo a maior parte dos fertilizantes consumidos internamente, a importação de fertilizantes intermediários caiu 27,5% em abril na comparação com 2014, para 1,404 milhão de toneladas. No primeiro quadrimestre, a queda foi de 24,2%, para 5,298 milhões de toneladas.

Apesar do cenário desfavorável, o trigo ainda é uma excelente opção para o inverno, pois bem manejado pode dar retorno econômico, mantém a sustentabilidade do sistema, controle e redução do banco de semente de plantas daninhas, alternativa para rotação de cultura, cobertura e conservação do solo, aproveitamento do maquinário e mão de obra e aumentando a produtividade da cultura de verão. O agricultor dispõe de excelentes cultivares, domínio da tecnologia para produção de trigo e há uma demanda das indústrias pelo cereal. As condições de solo e clima são, na maioria das vezes favoráveis, existe uma de estrutura de produção implantada, com assistência técnica capaz de orientar para a produção de um trigo de qualidade.

Disponibilidade de Cultivares

O estado do Rio Grande do Sul apresentadas duas regiões homogêneas de adaptação de cultivares de trigo utilizadas para fins de indicação de cultivares no Zoneamento Agrícola de Risco Climático do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e para realização de ensaios de Valor de Cultivo e Uso (VCU) de trigo. No RS, foram testados 40 cultivares de 6 diferentes obtentores em 1.542 parcelas posicionadas em 7 locais, o que permite a determinação da cultivar, conforme  local, expectativa de rendimento e resistência a doenças. A escolha de cultivares com desempenho agronômico satisfatório, ou seja, que tenha produtividade elevada em vários ambientes de cultivo, é de extrema importância para quem produz trigo. Esta escolha deve ser realizada com antecedência com relação a semeadura, pois permite planejar a época de colheita, definir as cultivares com maior potencial produtivo e boa tolerância a moléstias. Além dos aspectos agronômicos, analisar o preço que está sendo praticado pelo mercado de acordo com o tipo de trigo cultivado, se for trigo para panificador, brando ou melhorador, pois isto ajuda na maximização dos resultados da lavoura. A diversificação de cultivares e de ciclo de crescimento é recomendável para a minimização de riscos na cultura, como os decorrentes de doenças e de geadas. Além disso, a alteração na patogenicidade dos organismos causadores de doenças torna necessária a substituição de cultivares por outras mais resistentes e/ou mais produtivas, já que a interação genótipo-ambiente é um processo dinâmico que necessita da atuação permanente do melhoramento varietal (SOUSA et al., 2004).

Efeito do trigo no controle de plantas daninhas.

Os herbicidas e a preparação de solos não são as únicas formas de controlar as plantas daninhas, o controle cultural é uma alternativa de controle que consiste em utilizar característica ecológica da cultura e da planta infestante de tal forma que a primeira leve vantagem na competição, sem aumento do custo de produção. Tanto as questões que tratam da habilidade competitiva das cultivares de trigo sobre o azevém (principal planta daninha da cultura) como o manejo do sistema que objetiva também o controle da buva. O cultivo da área com trigo diminui o número de plantas de buva quando comparado com áreas não cultivadas, deixadas em pousio (Figura 3). A associação do efeito supressor das culturas com uso de herbicidas aumenta a eficiência de controle da buva. Segundo Vargas, pesquisador da EMBRAPA trigo, resultados permitem concluir que a população de buva é maior em áreas mantidas sem cultivo (pousio) do que em áreas cultivadas com trigo ou aveia-preta durante o inverno. A cultura do trigo exerce efeito supressor sobre a população de buva e proporciona maior facilidade aos herbicidas para controlar as plantas dessa espécie na pré-semeadura das culturas sucessivas, por proporcionarem plantas daninhas em menor número e estatura e, assim, mais sensíveis aos herbicidas. Contudo a semeadura deve ser realizada no momento mais favorável para o desenvolvimento da planta de trigo tendo uma emergência e estabelecimento rápido. Lavoura de trigo com 300 plantas emergidas / m2.

Outra vantagem do trigo é a cobertura morta e os resíduos do cultivo que permanecem sobre o solo. Ela funciona como um elemento isolante que reduz a amplitude térmica do solo e filtra a luz solar. O processo de germinação de plantas daninhas está intimamente relacionado a estes fatores, reduzindo substâncialmente sua emergência em plantio direto com abundante quantidade de cobertura morta (ADEGAS, 1999). Quando se deixa de preparar o solo, grandes quantidades de sementes de invasoras se mantém a profundidades que impedem sua germinação e emergência. A presença da cobertura morta altera as características físicas, químicas e biológicas do solo e interfere no processo da quebra de dormência das sementes (ALMEIDA, 1991).

O proceso de decomposição da cobertura morta na superfície libera gradualmente uma série de compostos orgânicos denominados alelequímicos, muitos deles interferem diretamente na germinação e emergência das plantas indesejáveis. A quantidade e a composição da cobertura morta é responsável pelo nível de interferência. Ao preparar o solo a palhada se decompõe rapidamente e esta é uma das razões porque o controle de plantas daninhas obtido é superior em plantio direto. O agricultor deve utilizar todos as técnicas de cultivo que possam minimizar os efeitos dos plantas daninhas. Não existe uma técnica milagrosa ou algum herbicida (molécula) que possa resolver com exclusividade os problemas de plantas daninhas. Nesse sentido as premissas do plantio direto e da rotação de culturas devem ser intensificadas. O sinergismo entre a sucessão trigo-soja é interessante pois a soja amplia a produtividade em até 500 kg/ha, muito devido a maior “janela” para o manejo de plantas daninhas na soja que quando em sucessão ao milho em 10 dias após a emergência já causam redução de 5% na produtividade de grãos. Contudo, a soja em sucessão ao trigo possui uma janela maior, em torno de 35 dias após a emergência para causar a mesma redução (Rodrigo Rudiéri dos Santos da Faculdade Integrado de Campo Mourão).

O trigo apresenta-se como uma alternativa de rotação de culturas para a região e uma oportunidade para os produtores saírem da sucessão Soja/Milho/Feijão, que, normalmente ocorre em áreas irrigadas por pivô. A rotação de culturas é uma ferramenta que facilita o controle de plantas daninhas e diminui os riscos de selecionar plantas daninhas resistentes. No manejo das infestantes o princípio da prevenção deve ser privilegiado. Portanto, recomenda-se o uso de práticas que evitem a ressemeadura de invasoras; recomenda-se também a manutenção de uma boa quantidade de palha, o uso de plantas com efeito alelopático, bem como perpetuação de pragas e fungos nas áreas, efeitos que se consegue com o trigo. A semeadura em época adequada (antecipado para maximizando a habilidade competitiva com as invasoras, o uso de máquinas que permitam um bom corte da palha (com pouco revolvimento de solo na fileira de e deposição da semente em contato com o solo) e evitar períodos de pousio entre as culturas. A incidência de plantas daninhas está em relação direta com o comprimento do período de descanso. O pousio de inverno oferece cobertura verde e morta deficiente durante o período de inverno e de desenvolvimento da cultura de verão.

A cobertura permanente do solo, otimizada pelo sistema plantio direto, não constitui condição suficiente para disciplinar à enxurrada e controlar a erosão hídrica. A mobilização mínima do solo e a semeadura direta têm como benefícios a redução de perdas de solo e água por erosão, a redução de perdas de água por evaporação, a redução da incidência de plantas daninhas, a redução da taxa de decomposição da matéria orgânica do solo, a preservação da estrutura do solo, a preservação da fertilidade física e biológica do solo, a redução da demanda de mão de obra, a redução dos custos de manutenção de máquinas e equipamentos, a redução do consumo de energia fóssil e a promoção do sequestro de carbono no solo.

De acordo com Engenheiro Agrônomo Henrique Pereira dos Santos, em  sistemas de rotação com trigo, após quatro anos sob Ca + Mg trocáveis, em relação às camadas mais profundas, e, conseqüentemente, os teores plantio direto na camada de solo 0 a 5cm, são verificados valores maiores de pH e de de Al trocável são menores na camada 0-5cm do que naquelas mais profundas. Os teores de matéria orgânica, de P extraível e de K trocável, na maioria dos sistemas, declinaram gradadivamente com o aumenta da profundidade de amostragem, da camada superficial (0-5cm) para a camada mais profunda (15-20cm).

A monocultura da soja, muitas vezes com cultivares de baixa produção de massa, tem deixado o solo descoberto após a colheita de verão, já que, diferente do milho, a palhada de soja se decompõe rapidamente após a colheita. O sistema plantio direto, muito utilizado na Região Sul, necessita de plantas, especialmente gramíneas, com capacidade de produção de grandes quantidades de palha. A cobertura do solo com culturas de inverno é fundamental para evitar a erosão e a lixiviação de nutrientes que são perdidos durante enxurradas.

A sucessão trigo-soja é, historicamente, a principal alternativa econômica para os sistemas de produção de grãos no sul do Brasil. Nos últimos anos, mudanças implementadas nos processos produtivos estão causando incertezas no produtor quanto à viabilidade técnica e econômica desta sucessão. De acordo com o pesquisador João Leonardo Pires, tecnicamente o trigo e a soja são culturas que se ajustam perfeitamente no aproveitamento das estações de crescimento de inverno e de verão, potencializando complementaridades da rotação gramínea-leguminosa, além de utilizarem estrutura de produção e maquinário similares. Entretanto, mudanças que vêm ocorrendo no sistema de produção têm ameaçado esta sequência de culturas, como a adoção de cultivares de soja superprecoces e/ou de tipo indeterminado, antecipação de épocas de semeadura da soja, cultivo de soja “safrinha”, entre outros.

 Demanda de trigo pela indústria

O trigo representa, aproximadamente 30,0% da produção mundial de grãos. O cereal é empregado na alimentação mundial de grãos. O cereal é empregado na alimentação humana (farinha, macarrão, biscoito, bolos, pães, etc), na elaboração de produtos não alimentícios (mistura adesivas ou de laminação para papéis ou madeiras, colas, misturas par aimpressão, agentes surfactantes, embalagens solúveis ou comestíveis, álcool, antibióticos, vitaminas, fármacos, coméstico, etc.) bem como na alimentação animal, na forma de forragem, de grão ou na composição de ração. No Brasil estima-se que 94,5% da produção seja destinada ao processamento industrial, 2,5% seja reserva de semente e, aproximadamente, 3,0% utilizada diretamente na alimentação animal.

Resultante de fungos como a giberela, por exemplo, que atacou fortemente a cultura em razão do excesso de umidade, o teor da micotoxina desoxinivalenol (chamada de Don) impede que o grão seja usado no Brasil pelo risco de provocar náusea e vômito em humanos e animais. Outra alternativa para escoar o cereal de baixa qualidade tem sido a indústria de cola de São Paulo. Boa parte do produto ainda não vendido está estocada em cooperativas gaúchas. Normalmente, as cooperativas recebem 50% da safra de inverno. Mas, neste ano, o volume chegou a 60%, pois a baixa qualidade do produto fez cair o interesse do mercado — afirma Paulo Pires, presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado (Fecoagro).

Para a indústria de panificação gaúcha, restaram cerca de 800 mil toneladas em condições para moagem — com PH entre 76 e 78. Para chegar à média de 1,6 milhão de toneladas processadas por ano, o setor terá de aumentar as importações da Argentina e dos Estados Unidos — principais países produtores. Trazer o grão de fora resulta em custos maiores para a indústria, inevitavelmente — aponta José Antoniazzi, presidente do Sindicato da Indústria do Trigo no RS (Sinditrigo). De acordo com Antoniazzi, enquanto a tonelada de trigo no mercado interno custa R$ 470, o produto importado requer um desembolso de quase R$ 700 por tonelada — em torno de 50% a mais. Por isso, os moinhos já estão repassando o produto com um preço maior.

A maior competitividade das lavouras triticolas será conseguido por ajustes no sistema, de forma a utilizar-se tecnicamente todos os insumos na quantidade e no momento correto. Permitindo que a planta de trigo tenha vantagem competitiva em relação a pragas, doenças e plantas daninhas. Melhorando assim a quantidade e a qualidade do produto produzido.

A cultura do trigo deve ser planejada em conjunto, tornar ele parte do sistema, conhecer a variabilidade na área (Figura 5) e tirar proveito dessas zonas potenciais onde os efeitos negativos causados pela geada, umidade, baixa fertilidade etc, não comprometam a qualidade e a produtividade. Os recursos da agricultura de precisão e o cultivo do trigo, durante o inverno, também é uma possibilidade de conhecer a lavoura e melhorar esse ambiente para as culturas de verão.

Autores: 

Isac Aires de Castro/ Acadêmico do Curso de Agronomia – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA  (UFSM)

Thomas Newton Martin/ Eng. Agrônomo, Professor Doutor do Departamento de Fitotecnia – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA (UFSM)

Antônio Luis Santi/ Eng. Agrônomo, Professor Doutor do Departamento de Ciências Agronômicas e Ambientais – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA, Campus de Frederico Westphalen – (UFSM/CESNORS)



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