Em meio ao período de seca, típica do mês de julho na região central do país, da parte alta de uma propriedade rural brota água. Antes conhecida como “fazenda das erosões”, a Fazenda Bianco hoje é referência como produtora de água e agricultura conservacionista. Situada na área do município de Cabeceiras de Goiás, a 130 quilômetros de Brasília, a fazenda eliminou as erosões da área e realimentou as nascentes de água em um período de 20 anos.
O proprietário da fazenda, Arno Bruno Weis, conta que o resultado foi alcançado graças ao Sistema de Plantio Direto, técnica em que o solo é coberto com palhas, resíduos de plantação ou com as chamadas plantas de cobertura que mantêm a umidade, retêm nutrientes e aumentam a fertilidade.
Além da cobertura do solo, o produtor pratica a rotação de culturas e obedece ao vazio sanitário para controlar a incidência de pragas e doenças. Em uma área aproximada de mil hectares, a fazenda produz milho, soja, feijão e trigo mourisco. Em 2018, a colheita rendeu 150 mil sacos de milho safrinha, 40 mil sacos de soja e 24 mil de feijão.
“Após a colheita, a gente consegue manter uma planta de cobertura que vai proteger o solo no final da chuva, e, na época seca, vai manter mais matéria orgânica. Então, é um ciclo que se alimenta e se sustenta melhor, é um ciclo de sustentabilidade e conservação”, comentou Walter Fretta Weis, engenheiro agrônomo da fazenda.
Conforme definição da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), o sistema de plantio direto tem como princípios básicos a cobertura de solo, a rotação de culturas e o não revolvimento da terra para não degradar a área no momento da semeadura.
O Brasil tem 32,87 milhões de hectares de área cultivada sob plantio direto, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados pela Federação Brasileira de Plantio Direto. A técnica pode ser aplicada em propriedades de pequeno, médio ou grande porte. Também há experimentos na agricultura orgânica e é adaptável a diferentes culturas, como café, cana de açúcar, hortaliças, entre outros.
O Censo Agropecuário do IBGE de 2017 aponta que 19% dos estabelecimentos agropecuários do país utilizam o sistema de plantio direto, 36% praticam cultivo mínimo e 45% plantam de forma convencional.
Base para agricultura sustentável
A técnica de plantio direto foi introduzida no interior do Paraná na década de 70 e é considerada a primeira revolução das práticas agrícolas no Brasil. O sistema diminui o uso de máquinas e tratores reduzindo, assim, a emissões de gases do efeito estufa na atmosfera.
O plantio direto é uma das principais tecnologias que integram o Plano da Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. No início do mês de julho, representantes da Federação Brasileira de Plantio Direto apresentaram ao Ministério o projeto intitulado “Sistema Plantio Direto: base para Agricultura Sustentável”.
Elaborado por especialistas e técnicos de diferentes instituições, o projeto pretende criar uma base de dados que permitam quantificar os benefícios do sistema, como a capacidade de recuperação de matéria orgânica do solo e indicadores de qualidade, e incentivar a formulação de políticas de incentivo à agricultura sustentável.
“Esse projeto prevê a construção de modelos para avaliar o quanto de carbono orgânico fica retido no solo em diferentes biomas brasileiros”, explicou Maurício Carvalho, agrônomo que atua na Coordenação de Conservação do Solo e de Água do Mapa.
Agricultura de precisão
Na Fazenda Bianco também são utilizados quadriciclos para agricultura de precisão, com o objetivo de mapear as diferenças de qualidade do solo em toda a extensão da propriedade. Para atender à legislação ambiental, a propriedade mantém uma área de reserva legal que corresponde a 30% de toda a área de produção da fazenda. E nas áreas degradadas, foram plantadas algumas árvores nativas do cerrado.
Como a propriedade está situada próxima a uma rodovia, o produtor adequou as margens da estrada com a nivelação de barrancos e o plantio de eucaliptos para conter a água da chuva. Na sede da fazenda, a casa foi projetada para captar umidade e conta com um sistema natural de aquecimento de água. “Aproveito a natureza e tudo o que ela pode oferecer”, disse Weis.
Com os resultados na redução do impacto ambiental, a fazenda atrai todos os anos muitos visitantes, inclusive de outros países. Em 2011, o proprietário recebeu o Prêmio Goiás de Gestão Ambiental e por duas vezes foi condecorado com menções honrosas por melhor produtividade de milho da América Latina.
Transmissão de conhecimento
Arno Weis é natural de Hulha Negra, Rio Grande do Sul, onde começou as atividades agropecuárias em 1966. Toda a família é envolvida com agricultura há muitas gerações. Com o objetivo de desbravar novas áreas de produção, o produtor se mudou para o Centro-Oeste no início da década de 80. Depois de passar por diferentes cidades, o fazendeiro se estabeleceu em 1995 com sua família em Cabeceiras de Goiás.
Aos 73 anos de idade, Weis gosta de guardar relíquias para destacar o avanço da agricultura nos últimos anos, como tratores e outros tipos de maquinários agrícolas. E permanece ativo não só na condução da fazenda como na mobilização de jovens produtores da região para aderir ao plantio direto e outros processos de agricultura sustentável.
“Assim como os outros me ensinaram, eu tenho a obrigação de passar adiante”, comenta Weis, que também preside o Sindicato Rural de Cabeceiras e integra o Conselho Estadual Comunitário de Segurança Rural.
“Pensando em uma agricultura de larga escala, o plantio direto gerou um benefício enorme para o meio ambiente, evitando degradação do solo e melhorando sistema de cultivo. Hoje, a gente consegue fazer duas safras, safra e safrinha, o cultivo aguenta mais tempo no período de veranico e de falta de chuva. Então, o plantio direto, a meu ver, é um dos principais meios conservacionistas que a gente tem hoje na agricultura em larga escala”, completa o filho agrônomo Walter Weis.
Fonte: DATAGRO