Uma das ferramentas estratégicas para garantir o ganho de peso do rebanho, a suplementação mineral de bovinos requer algumas práticas de manejo para atingir resultados superiores. Para orientar o produtor rural, o portal Agronovas conversou com o engenheiro agrônomo e consultor da Boviplan – uma das mais conceituadas consultorias em gado de corte do País. Com experiência de 22 anos na área, Paulo Araripe, é também consultor técnico da Farms Agro no Rio Grande do Sul e tem especialização em produção animal e forrageira. Além dessa bagagem, Araripe conhece bem a lida na prática, afinal é pecuarista em Piracicaba/SP. Confira a entrevista:
AGRONOVAS – Qual o principal objetivo da suplementação mineral de bovinos?
ARARIPE – Existem diversos tipos de tecnologia de suplementação à disposição do pecuarista hoje em dia. A área de nutrição animal tem se desenvolvido rapidamente e ela é responsável por parte do incremento em produtividade que vemos hoje na pecuária brasileira em todas as suas fases, seja na cria, na recria, na engorda ou no ciclo completo. Para que consigamos utilizar os benefícios nutricionais que a suplementação de bovinos de corte moderna oferece atualmente, temos que entender que suplementar significa complementar a nutrição que é oferecida aos animais. Dentro deste contexto, a suplementação completa o que já se tem, não sendo atribuída à ela a responsabilidade de alimentar o animal, apenas ajudar a melhorar a sua dieta. Posto isso, se a fazenda oferece pastagem de baixa qualidade, a participação da suplementação deve ser maior na rotina da propriedade e, se a pastagem for de boa qualidade, essa participação pode ser menor. Dentre os tipos de suplementação que dispomos hoje temos a (I) mineral ou linha branca, que trata apenas da complementação dos elementos minerais, (II) a proteica, onde se tem a pretensão do fornecimento de proteína complementar e a (III) energética, onde se pretende fornecer maiores níveis energéticos na dieta dos animais. Hoje em dia, a pecuária intensiva, lucrativa e precoce, que trabalha com ciclos mais curtos de produção e altas produtividades está deixando o conceito de linha branca para trás e se beneficiando do aporte de outros nutrientes (proteína, energia, aditivos para conversão alimentar, etc.) juntamente com os minerais para turbinar aspectos reprodutivos e ganhar velocidade de engorda, terminação e crescimento. Portanto, hoje, diferente do que era há 15 anos, a suplementação objetiva tornar a pecuária de corte mais competitiva e rentável economicamente, permitindo que o pecuarista encurte seu ciclo de produção e aumente sua lotação.
AGRONOVAS – Quais são os cuidados que o pecuarista deve ter no manejo dessa suplementação?
ARARIPE – Nas andanças no campo, pelo Brasil pecuário, notamos que medidas simples não são respeitadas pelos pecuaristas no uso da suplementação e podem prejudicar o bom desempenho da tecnologia. Um bom exemplo é a disponibilidade de cochos e a localização do mesmo. Dependendo do produto com o qual se está trabalhando (linha branca, proteicos e/ou energéticos), há que se ter diferentes disponibilidades de cochos (centímetros lineares por cabeça) para que o consumo correto seja atingido. Produtos que preconizam maiores consumos exigem que o animal fique mais tempo ao redor do cocho e, obviamente, devem ter mais espaço para que todo o lote ou rebanho consiga consumir adequadamente. O pecuarista deve entender que consumo e desempenho estão diretamente ligados, ou seja, animal que consome mais, ganha mais. A localização dos cochos também exerce grande influência nos desempenhos: quanto mais próximos da fonte de água estão, maior é o consumo. É muito comum ainda ver no campo a fonte de água em direções opostas aos cochos de sal. Outro cuidado importante de manejo é relacionado à frequência de salga, que é pequena na minha opinião, na maioria das propriedades. Lotes que só recebem reabastecimento dos cochos uma ou duas vezes por semana é muito comum, mesmo em pequenas propriedades. Não há um planejamento no sentido de mensurar o consumo e montar um esquema de salga que evite a ausência do produto e, ao mesmo tempo, que ele se deteriore, em virtude de estar exageradamente dimensionado, sobrando. Apesar disso tudo, o principal cuidado que tenho recomendado é a adequação do produto à condição de alimentação à que os animais estão submetidos. Há que se avaliar a base forrageira que se oferece aos animais para determinar que tipo de suplementação vamos trabalhar. É muito comum, no inverno gaúcho, por exemplo, observar campos secos, com teores baixíssimos de proteína, sem suplementação proteica, e com animais apenas consumindo sal mineral, linha branca. As pastagens cultivadas, sejam elas de inverno ou de verão, também poderiam turbinar os ganhos dos animais (engorda ou mesmo terminação) e não vemos aporte energético nelas. Muitas vezes os pecuaristas nem sal mineral oferecem nestas pastagens, quando poderiam acelerar seus negócios, engordando mais animais, com maior velocidade de ganho de peso diário.
AGRONOVAS – No sul do país o clima é diferenciado com estações mais bem definidas. O que muda na suplementação dos animais de corte com esse comportamento do tempo e, principalmente, com alta disponibilidade de forrageiras?
ARARIPE – No inverno gaúcho somente contamos com alta disponibilidade forrageira se o pecuarista faz uso de cultivo de pastagens de inverno, como aveia e azevém, consorciadas ou não com campo nativo e/ou leguminosas. Caso contrário, como temos visto, os campos nativos maduros e secos pela geada são as únicas fontes forrageiras disponíveis nesta época. Quando a planta forrageira está madura, sementeando e seca, o teor de proteína é baixo demais, menor que a exigência dos bovinos. Neste momento é oportuno trabalhar com materiais proteicos e aportar o que a forragem não consegue mais oferecer. Observe que me refiro ao uso de farelos e não de ureia, como muitos pensam ser o ideal. Se o pecuarista quiser que seu rebanho ganhe peso nesta época e a reprodução esteja funcionando a contento, dependendo do rigor do inverno, seu sistema entra em colapso e temos o cenário inverso, ou seja, perda de peso e baixa fertilidade das fêmeas. Agora, caso tenhamos situação onde o pecuarista tem acesso à pastagens cultivadas, com alto teor de proteína, o ideal é que ele forneça energia e turbine seus animais, fazendo-os ganhar mais peso por dia, colocando mais animais por área, que é o grande benefício da suplementação de alto consumo.
AGRONOVAS – Na sua opinião, o que é mais importante para o pecuarista: redução da idade de abate, taxa de prenhez, acabamento de carcaça ou desmame precoce. E de que forma a suplementação pode contribuir para atingir esse resultado?
ARARIPE – Todos esses fatores são muito importantes e eu não conseguiria apontar apenas um só. Na verdade eles estão todos ligados e a suplementação correta potencializa todos eles, fazendo com que o ciclo pecuário se encurte de tal forma que acaba por deixar mais lucro para o pecuarista no final das contas. É mais gado engordado por unidade de tempo. Quando aumentamos a taxa de prenhez do rebanho, partindo para a desmama de terneiros precoces e mais pesados, que resultarão em animais com reduzida idade ao abate, com carcaças melhoradas (mais gordura e maior valor agregado), entramos no mundo da pecuária intensiva e que deixa lucro, melhor que a agricultura muitas vezes. A suplementação praticada sob supervisão técnica dentro destes fatores que citou, resulta no abate de um boi no ano posterior ao seu desmame, ou seja, com, no máximo, 28 meses de idade (se a desmama se der em abril com 8 meses de idade + 8 meses até o final do primeiro ano + 12 meses do ano posterior = 28 meses). Se considerarmos o peso à desmama de 210 quilos e o de abate de 540 quilos, temos que alcançar um ganho de peso diário de 0,55 quilo por todos os 20 meses que este animal ficar em engorda. Este ritmo de ganho de peso é bastante forte e difícil de atingir como média, principalmente quando o inverno é rigoroso e o verão seco demais no Rio Grande do Sul. Neste cenário somente com uma boa suplementação conseguimos esses níveis.
AGRONOVAS – Pela sua experiência de 22 anos em produção animal, qual o resultado econômico do uso de suplementos minerais para o gado de corte?
ARARIPE - É possível dobrar o desfrute (quantidade de animais abatidos em relação ao rebanho) da pecuária tradicional, com ajuda da suplementação. Se uma boiada tradicional fica pronta e é abatida em 42 meses, é perfeitamente possível abatê-la com 21 meses com ajuda da tecnologia de suplementação hoje disponível. De forma grosseira, a relação benefício custo da tecnologia é de 1 para 3, ou seja, para cada R$ 1,00 gasto com suplementação, voltam R$ 3,00. Isso quando não é R$ 1,00 para R$ 5,00, o que não é raro. Volto a frisar que trabalhando com planejamento e tecnologia é possível lucrar com a pecuária mais do que com agricultura. Temos inúmeros exemplos disso pelo Brasil. O Rio Grande do Sul tem grande potencial para fazer pecuária desse nível e ganhar ainda mais. Se considerarmos o baixo risco, a grande liquidez da atividade e a possibilidade de produzir carne de qualidade que o Rio Grande do Sul tem, não vejo melhor empreendimento do que a pecuária de corte nos dias atuais. Principalmente frente aos preços hoje praticados pelo quilo do boi gordo e do terneiro. Gostaria de lembrar que esses resultados em desempenho, técnico e econômico, só aparecem com muito trabalho, sempre baseados em tecnologias comprovadas pela ciência e colocadas em prática por profissionais habilitados e comprovadamente competentes, com experiência.