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Oferta e demanda internacionais de grãos coloca mercado em alerta

Os altos preços dos grãos, principalmente soja e milho, no mercado internacional refletem a relação – já um tanto estreita – entre oferta e demanda no Brasil e no mundo. Com os estoques globais dessas commodities em baixa por conta da queda na produção e produtividade das lavouras em função de adversidades climáticas e do aumento do consumo mundial, o setor tem convivido com uma certa tensão. Essa linha tênue entre oferta e demanda, que não deve mudar no curto prazo, impacta nos custos de produção das proteínas animais e na sustentação das cotações no cenário global.

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Neste contexto, os Estados Unidos ocupam um papel primordial, visto que o
baixo volume dos estoques de soja no país vem causando maior tensão no mercado
e explica as altas significativas na Bolsa de Chicago. Dados do boletim do
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda), divulgado em abril,
apontam que os estoques norte-americanos estão em 3,3 milhões de toneladas –
redução de mais de 80%, se comparado aos 17 milhões de toneladas de agosto do
ano passado.

Do outro lado está a China que, em 2020, concentrou o apetite pela soja
norte-americana – mesmo porque o Brasil praticamente não tinha mais o grão
disponível no segundo semestre do ano. Desde o surto de Peste Suína Africana
(PSA), o país asiático precisou fazer robustos investimentos na reconstrução do
seu rebanho, o que levou a uma dinâmica de compra mais agressiva nos mercados
de soja e de milho.

O interesse chinês pela importação do cereal, no entanto, é um fator
inédito. Até então, o país não possuía um histórico de compras de milho em
grandes volumes – somente neste ano, foram negociadas quase 30 milhões de
toneladas, sendo a maior parte proveniente dos EUA. Isso também derrubou os
estoques norte-americanos do cereal para 34,3 milhões de toneladas – em agosto
de 2020, eram 70 milhões.

“A relação entre estoque final e consumo mundial é a mais baixa das
últimas sete safras para o milho e para a soja. Diante disso, os preços destas
commodities permanecem como um importante fator de suporte para este ano. Vale
ressaltar que 69% do estoque mundial de milho e 34% de soja estão na China”,
afirma a técnica do Departamento Técnico e Econômico (DTE) da FAEP, Ana Paula
Kowalski.

Oleaginosa

A quebra da safra 2019/20 nos EUA foi um dos principais fatores que levaram à redução dos estoques da oleaginosa e que, diante do papel significativo dos norte-americanos, impactou na oferta mundial. “Tempestades em Iowa e em parte de Illinois em agosto do ano passado, com ventos de até 240 quilômetros por hora, trouxeram uma quebra quase inédita para a safra norte-americana, principalmente porque o milho e a soja já estavam praticamente prontos para a colheita”, relembra Paulo Molinari, analista da consultoria Safras&Mercado.

O resultado, em relação às projeções iniciais, foi uma produção menor em
10 milhões de toneladas de soja e em quase 20 milhões de toneladas de milho.
Com isso, o estoque norte-americano da oleaginosa, que era de 15 milhões de
toneladas, foi reduzido a um terço.

Segundo Ana Luiza Lodi, analista de inteligência de mercado da consultoria StoneX, enquanto a China investe para reconstruir seu rebanho suíno, outros países também ampliam as importações da oleaginosa, o que contribuiu para o aumento da procura pelo grão. A explicação pode estar na retomada da economia mundial após a crise ocasionada pela pandemia do coronavírus, com o avanço da vacinação em muitos países.

“A China acabou reforçando a produção de outras proteínas, principalmente
quando o rebanho suíno estava mais curto. Além disso, vemos outros países
elevando as importações de grãos, diante das perspectivas positivas de demandas
por proteínas animais ao redor do mundo e o crescimento do setor de
biocombustíveis”, aponta Ana Luiza.

A chegada de uma nova safra da América do Sul deve ser suficiente para
abastecer o mercado de soja até a entrada da próxima safra norte-americana, a
partir de outubro de 2021. A estimativa de produção brasileira do grão na safra
2020/21 é recorde, de 136 milhões de toneladas – superior aos 129 milhões da
temporada 2019/20.

“A chave do mercado internacional é essa safra norte-americana, mas
depende do clima. Só que agora há uma tensão maior porque os estoques
norte-americanos já estão muito baixos”, observa Molinari.

Do ponto de vista do mercado brasileiro, segundo o superintendente de
inteligência e gestão da oferta da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab),
Allan Silveira, a expectativa é de que produção nacional alivie a pressão sobre
a oferta doméstica. “Passamos por um estoque muito apertado, principalmente no
final de 2020. Foi suficiente para o abastecimento do mercado interno, mas teve
essa disparada de preços no cenário internacional. A perspectiva, até o fim
deste ano, é de que os estoques estejam maiores em relação a 2020”, pontua.

Cereal

Apesar das boas expectativas para o Brasil em relação à colheita de soja, as adversidades climáticas podem interferir na oferta de milho. Em 2020, houve atrasos no plantio da oleaginosa em diversas regiões devido à escassez de chuvas. Essa estiagem estreitou a janela de semeadura do milho safrinha e, consequentemente, deixou a cultura suscetível aos riscos climáticos. Ainda, a demanda interna robusta e o aumento das exportações ao longo de 2020 pressionaram os estoques brasileiros.

Neste caso, o câmbio favorável associado às altas cotações de Chicago
impulsionaram as vendas externas, deixando a oferta interna ainda mais
reduzida. “Há um atrativo para vender para fora. Além disso, especificamente no
Paraná, houve uma das piores secas no último ano, o que reduziu o número de
pastagens e, consequentemente, aumentou o consumo de ração”, explica Turra.

Segundo a Conab, os estoques brasileiros de milho se mantêm apertados até
maio, mas a safrinha deve suprir a necessidade do mercado interno, com uma produção
total das safras do cereal em 109 milhões de toneladas – 6,4% a mais que as 102
milhões da safra passada.

No cenário global, por outro lado, há uma disparada no consumo de milho,
com a China adicionando uma demanda de 30 milhões de toneladas somente nos
primeiros meses de 2021, reduzindo os estoques norte-americanos. Apesar das
expectativas em torno da recuperação do rebanho chinês, há incertezas sobre a
manutenção desta demanda até a entrada da nova safra chinesa em outubro.

“Devido à demanda da China, criou- -se um ambiente de pressão em cima da
safra norte-americana, porque não se sabe se o país vai continuar comprando
milho nessa proporção. Mas, com os preços atuais, a tendência é que o
agricultor norte-americano plante o máximo de milho que puder”, salienta
Molinari, da Safras&Mercado.

Ainda, as políticas favoráveis do presidente dos EUA, Joe Biden, em
relação aos biocombustíveis, são mais um indicativo do aumento da demanda
norte- -americana por grãos, principalmente milho. Segundo o Usda, as estimativas
de uso do cereal da safra 2020/21 para a produção de etanol são de 126,37
milhões de toneladas.

Planejamento e tecnologia são
aliadas na hora de produzir

A oferta reduzida de grãos é um fator que gera preocupação para o setor. No entanto, especialistas garantem que as chances de escassez no mercado interno são quase nulas. Isso porque, além de ser um movimento sazonal, o Brasil, em destaque o Paraná, investe em tecnologia para modernizar os sistemas de produção e aumentar a produtividade.

“Temos grandes investimentos em agricultura 4.0, uma extensão rural e uma
assistência técnica bem especializadas para garantir boa produtividade. Ainda,
existem pesquisas sendo desenvolvidas com excelentes resultados”, elenca
Salatiel Turra, chefe do Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria
de Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab).

Diante deste cenário influenciado por tantos agentes, a recomendação para
o produtor rural, principalmente o autônomo, é o planejamento estratégico e a
realização de compras antecipadas. “Aqueles que conseguem se programar com
contrato futuros tendem a ter uma margem de lucro mais elevada e garantir uma
rentabilidade”, destaca Turra.

Segundo o analista da StoneX João Pedro Lopes, o pecuarista que deixar as
compras dos insumos para o início do confinamento vai pagar preços elevados,
principalmente com o dólar em alta. “Isso pode impactar ainda mais nos custos
da produção e, dependendo, até desestimular a criação de animais confinados em
produção intensiva”, analisa.

Incerteza nos grãos tira o sono
dos pecuaristas

Os estoques apertados e os altos preços dos grãos, combinados à significativa perda de força do real frente ao dólar, impactam diretamente a cadeia de proteína animal brasileira. Se por um lado o aumento dos custos de produção e a redução da oferta interna de grãos preocupam os produtores, por outro, a demanda internacional pela carne brasileira fica aquecida.

“Quando internalizamos os preços em dólar no mercado brasileiro, o custo
da ração fica bastante elevado. Então, há esse processo que faz com que os
preços das carnes subam. Ainda, temos uma demanda elevada, fazendo a carne
brasileira despontar como alternativa e a remuneração da exportação compensar
mais”, analisa Ana Luiza Lodi, da StoneX.

Apesar do forte início da reconstituição do rebanho chinês em 2020, a
preocupação com uma segunda onda de PSA causa incertezas no mercado. “O cenário
de uma demanda forte tem contribuído para a sustentação dos preços altos, mas o
papel da China é muito grande e a gente tem que acompanhar essa questão da
doença. Qualquer alteração na China pode causar um impacto global”, alerta.

Em relação à carne bovina, o mercado está num movimento de alta desde
2019, em que a disponibilidade de animais para abate reduziu significativamente
no Brasil. “O ano de 2020 foi bastante pautado por essa situação e 2021 deve
ser igual. A oferta de gado é pequena, o que dá suporte aos preços. Por outro lado,
a demanda por carne bovina caiu por causa do encarecimento substituída por
proteínas mais baratas, como frango, porco e ovos”, salienta o analista João
Pedro Lopes, da StoneX.

Para 2021, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) estima o
crescimento de cerca de 5% da produção e do consumo de frangos e de ovos. Esse
movimento é pautado, principalmente, pelos altos patamares do preço da carne
vermelha e a diminuição do poder de compra do consumidor brasileiro.

Apesar das projeções da safra 2020/21 no Brasil serem positivas,
principalmente de milho safrinha, aliviando a oferta apertada no mercado
interno a partir do segundo semestre, o setor de carnes não descarta as
preocupações em relação aos altos preços dos grãos.

Segundo o presidente da ABPA, Ricardo Santin, o câmbio elevado tem
influenciado as decisões de retenção de especuladores, que impulsionam custos e
inflação ao consumidor. Na avaliação da entidade, uma eventual desaceleração da
produção de proteína animal pode impactar a demanda interna. “O custo dos grãos
aumentou mais de 60% em relação ao ano passado, em algumas praças, essa alta é
superior a 100%. Diversas indústrias de aves estão operando no limite da
viabilidade econômica, e há relatos de diversas empresas que estão reduzindo a
produção para enfrentar o período”, relata.

“Temos apresentado solicitações ao Mapa [Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento] para ampliação de nossa capacidade de armazenamento e
instalação de armazéns, implantação de dispositivos de previsibilidade de
oferta de insumos e outras medidas, como a facilitação da importação de grãos
extra-Mercosul”, complementa Santin.

Em contrapartida, no cenário externo, a China ainda representa uma
oportunidade para as proteínas animais brasileiras. Segundo análise do chefe do
Deral, Salatiel Turra, o Paraná deve se destacar nesse cenário a partir do
reconhecimento de área livre de febre aftosa sem vacinação pela Organização
Mundial de Saúde Animal (OIE), em maio de 2021. “Isso vai abrir muitos mercados
para o Paraná”, aponta.

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Fonte: Sistema FAEP



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