O mel produzido por pequenos agricultores do Rio Grande do Sul está virando cosmético. O destino são redes de hotéis de todo o Brasil. Esse é um projeto que une agricultura familiar ao setor de turismo. Em um dos vários hotéis de São Paulo, os hóspedes recebem cosméticos feitos à base de mel. Os produtos são a ponta de uma cadeia que começa no campo. É de Vacaria, no nordeste do Rio Grande do Sul, que sai o mel usado na fabricação de muitos cosméticos. O estado é o maior produtor de mel do país. O município, conhecido pela produção de maçãs, também tem vegetação silvestre bem variada para a produção de mel: araucária, eucalipto, guamirim, carqueja, são algumas das centenas de espécies de árvores da região. Os apicultores, Alair Vargas e Paulo Rodrigues explicam o uso do fumigador.
- Quando a fumaça é aplicada, as abelhas se alimentam de mel, temendo o saque na colmeia. Ao se alimentarem, elas ficam com abdômen rígido e têm dificuldade de dobrá-lo para picar. Bem alimentadas, elas também ficam mais sonolentas – explica Alair.
Alair Vargas possui quase 30 anos de experiência, foi funcionário da indústria de metalurgia, mas agora se dedica exclusivamente à produção de mel. Ele cuida de 750 colmeias, em 25 apiários. A maioria em áreas arrendadas. Um dos apiários fica no sítio de quatro hectares da família. Alair não se arrepende da escolha que fez.
- É um trabalho mais pesado do que na indústria, porém a satisfação de trabalhar em um ambiente saudável, na natureza e com as abelhas, é grande – afirma.
Alair e Paulo fazem parte da Cooperativa de Apicultores de Vacaria (Avapis), selecionada para participar do projeto “Talentos do Brasil Rural”, fornecendo o mel para a indústria de cosméticos. Pra isso, os apicultores receberam treinamentos.
- Tem que ter cuidado com pragas invasoras nas colmeias, a troca de rainha, saber quando ela está produzindo bem. Tudo isso pra ter uma boa produção no final – comenta Paulo Rodrigues.
O mel retirado no campo é levado para a agroindústria, onde é extraído dos favos em uma centrífuga. Depois é decantado por 72 horas para a retirada de impurezas. Para esta etapa, os produtores também recebem orientações de boas práticas.
- Como fazer este processo de extração do mel, como utilizar os equipamentos e como utilizar a vestimenta. Questão de limpeza, higienização… Então para nós ficou muito interessante. E a gente tem mais segurança do que está fazendo e do produto que estamos entregando ao consumidor – avalia Paulo.
Antes de ir para indústria, o mel que sai do Rio Grande do Sul precisa ser transformado em extrato. Em uma empresa na região metropolitana de Curitiba (PR), o produto deixa de ser alimento e vira matéria-prima para a fabricação de cosméticos. A principal característica do mel como cosmético é que, dependendo do teor do açúcar, ele forma um filme de hidratação na pele e nos cabelos. A farmacêutica Ana Carolina Heemann esteve em Vacaria para orientar os produtores e confere se o produto cumpre os padrões estabelecidos no projeto.
- Na embalagem adequada, analisamos a rotulagem, validade, o lote do produto, em seguida as características desse mel – diz.
Ela analisa cor, odor, densidade, pH, o teor de acidez e também o teor de açúcar do produto. Passando nos testes, o mel começa a ser transformado com o uso de conservantes e antioxidantes.
- O mel quando chega aqui, está adequado para o consumo como alimento. Ele não deve ser utilizado como insumo cosmético porque ele pode cristalizar e assim influenciar na produção do shampoo, do condicionador, da loção. Então nós realizamos processos de transformação, adicionando outros ingredientes que evitam que isso aconteça – explica a farmacêutica.
Em forma de extrato, o mel segue para a indústria. Em uma delas são produzidas 14 linhas de cosméticos para redes de hotéis, sendo que uma possui um diferencial: embalagens e etiquetas são de material reciclável.
- Nesse projeto nós sabemos quem produziu. Em outros tipos de extratos que nós utilizamos, claro existe uma procedência, mas esse mel especificamente é da Cooperativa Avapis, de Vacaria. Todo consumidor que utilizar este produto, sabe que está utilizando algo que é resultado do trabalho daquele pequeno agricultor – declara Mauro de Oliveira, diretor comercial da empresa.
A Cooperativa de vacaria, além do valor pela venda do mel, tem ainda num retorno financeiro sobre cada um dos cosméticos: 5% do que é comercializado volta para os apicultores. A Avapis também pode vender os produtos.
- É mais um ganho para o cooperativado. Na nossa região se usa bastante a abelha mais para polinizar, então é uma maneira do pessoal começar a trabalhar para produzir mel também em maior escala do que produzimos hoje – comenta Edson da Silva, apicultor.
Hoje, os 49 cooperados produzem 60 toneladas de mel por ano e pretendem construir uma nova sede para aumentar a agroindústria.
- Quando comecei a trabalhar com apicultura, jamais imaginei que um dia nosso produto ia chegar a uma fabricação de cosmético e distribuição para o Brasil inteiro – comenta Alair Vargas.
O que os apicultores aprenderam no projeto está se refletindo na produtividade. Algumas colmeias já estão rendendo 50% a mais de mel.
Fonte: Globo Rural