É verdade que o modelo do avião e o desenho mudaram. O biplano monomotor foi substituído por um trimotor modelo Junkers 52 em 1936, mas as cores da ilustração e a lata não negam. É difícil não reconhecer a Manteiga Aviação. Tão difícil quanto fugir da palavra tradição para falar do produto. Líder no mercado brasileiro de manteiga, a empresa quase centenária prepara uma virada para dobrar a produção até o final deste ano. E não apenas na linha de manteiga. A expectativa é que a produção de doce de leite e requeijão também cresça 100% até o início de 2019.
Inicialmente, a mudança será possível com a substituição dos equipamentos da fábrica de 20.000 metros quadrados em São Sebastião do Paraíso (MG). Hoje, a produção diária é de 250 mil unidades de manteiga por dia (o equivalente a 1.200 toneladas por mês); 25 mil potes de doce de leite; 40 mil copos de requeijão; além de 20.000 litros destinados à produção de queijos.
“Há dez anos fizemos uma grande reforma e investimos em logística e armazenagem. Hoje temos os equipamentos necessários para aumentar a produção”, diz Roberto Rezende Pimenta Filho, diretor comercial da Laticínios Aviação.
Roberto trabalha com a irmã, Marina Resende Pimenta Portinari, responsável pelos processos de produção e qualidade da empresa. Eles fazem parte da quarta geração da mesma família de proprietários da Aviação, que nasceu em 1920 com um comércio de secos e molhados na capital paulista e uma indústria de laticínios em Passos (MG). O nome era uma homenagem à extraordinária tecnologia surgida na época.
De lá para cá, a companhia foi para a paulista Bebedouro, do outro lado da divisa, até voltar para Minas, em 1978, onde está sediada. Apesar da tradição, estampada em uma lata que teve apenas três modelos em quase 100 anos, a empresa diversificou a linha de produtos. Além do doce de leite, do requeijão e dos queijos, nos últimos dois anos a Aviação vem investindo em café e acabou de lançar uma marca de cappuccino.
“A briga no café é com as ‘manteigas Aviação’ do café”, diz Roberto, referindo-se a marcas há muito estabelecidas no setor.
Mas é a manteiga, ofertada em potes de plástico, em tabletes e na famigerada lata, que continua sendo o carro-chefe. O produto representa 65% de todo o faturamento, estimado em R$ 340 milhões em 2018.
Mesmo com a mudança na estrutura fabril, a Aviação trabalha com a possibilidade de abrir uma nova fábrica, mas não agora.
“Temos o projeto de uma nova fábrica. Já temos a planta e os equipamentos comprados, mas vamos esperar a situação do país melhorar”, diz Roberto, confirmando que a empresa tem um perfil conservador.
“Leite é um negócio complicado. As oscilações são muito grandes nesse mercado. Meu avô dizia que o leite é a praga do bezerro”, afirma. Para produzir 1 quilo de manteiga, são necessários 25 quilos de leite.
A matéria-prima é o creme de leite (não confundir com o produto final). Para isso, a aviação conta com 40 fornecedores, entre laticínios e cooperativas. A demanda é de 150.000 litros de creme de leite por dia. Além disso, a fábrica ainda conta com 135 pecuaristas que fornecem o leite de queijos, doce de leite e requeijão.
Com tamanha demanda, a Aviação estabeleceu um sistema de pagamento aos produtores que evita as oscilações do mercado.
“Isso significa que, na alta dos preços, não haverá pico de alta e, na baixa, não vai haver pico de baixa”, explica Roberto.
FOCO NA QUALIDADE
O cuidado com os fornecedores é evidente em cada uma das etapas da produção totalmente mecanizada da fábrica. Marina atribui o sucesso da Aviação aos cuidados com a qualidade.
“Desde a matéria-prima, cuidando dos produtores, até o laticínio, cada produto nosso é feito de acordo com os padrões necessários. Cuidamos dos detalhes em todas as etapas, seguindo as receitas originais como eram feitas antigamente”, diz.
O irmão complementa dizendo que já foi oferecida essência de manteiga à empresa.
“Eu apenas agradeço”, diz Roberto.
No fim do ano passado, Marina viu-se diante da necessidade de melhorar os processos também na fazenda da família, em São Sebastião do Paraíso. Na propriedade, além da produção de 350 hectares de café, há cerca de 50 vacas leiteiras. Os animais, é claro, fornecem para a fábrica, mas Marina, que é veterinária de formação, explica que a produção é experimental.
Pensando no bem-estar do rebanho e na qualidade do leite, ela contratou uma consultoria que, em pouco mais de três meses, fez dobrar a quantidade do produto.
“Precisávamos melhorar nosso próprio leite para, mais adiante, repassar o conhecimento técnico aos nossos parceiros”, diz Marina.
A empresa responsável pelo trabalho avaliou a estrutura da fazenda e a genética do gado.
“Fizemos um diagnóstico e vimos que a produtividade estava baixa. Tínhamos a necessidade de aumentar a produção e a produtividade”, diz o consultor e engenheiro agrônomo Ronan de Pádua Silva, da ViaVerde, também de São Sebastião. “A partir da análise do solo, vi que podíamos aproveitar mais da pastagem. O alimento é mais barato e traz mais conforto para o animal.”
Como resultado, a lotação de animal por área passou de quatro a cinco animais por hectare para 12 animais. A média de leite produzido saltou de 600 para 1.200 litros diários.
Com esse foco na qualidade, a Aviação caminha para comemorar o centenário. Quando perguntado sobre o consumo de manteiga, Roberto sorri e diz que é crescente.
“Temos de ter muito equilíbrio para investir, pois nossa demanda também só cresce”, diz o empresário.
Tanto que, para produtos tradicionais como a manteiga e o requeijão, a companhia não precisa mais fazer propaganda.
Fonte: Globo Rural