No meio rural, a exploração econômica da propriedade por meio da possibilidade de cessão do uso para terceiros, os chamados contratos de arrendamento, são comuns. O próprio Estatuto da Terra e o Decreto 59.566/66 definem os requisitos do contrato, prazos mínimos de validade e formas de pagamento. Ainda, a legislação determina que os produtores definam o preço do arrendamento em dinheiro e, eventualmente, a conversão em produtos, caso seja de interesse das partes envolvidas.
Porém, de acordo com a lei, não é possível que o arrendamento seja fixado diretamente por preço de sacas, prática comum nos contratos rurais. Nos casos de dívidas, a Justiça estava restringindo o direito do proprietário da terra de buscar seus direitos e, consequentemente, realizar a cobrança do valor devido. Ainda, em muitos casos, para conseguir reaver o montante, o produtor precisava recorrer a outros meios processuais.
Diante disso, recentemente, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (Resp 1.692.763-MT), a partir do voto da Ministra Nancy Andrighi, passou a garantir segurança jurídica aos contratantes. A Justiça entendeu que a execução de contrato de arrendamento rural, por meio da fixação de preço em sacas, é válida, uma vez que a cláusula foi firmada por ambos os contratantes, de acordo
com as suas vontades e a prática da região.
De acordo com o voto da Ministra, apesar de haver contrariedade ao disposto em lei, é preciso observar os termos que foram acertados em contrato pelas partes envolvidas, a partir da confiança legitimamente depositada, sempre “privilegiando a boa-fé, e afastando práticas contraditórias, impregnadas ou não de malícia ou torpeza”.
Essa decisão já foi aplicada em um caso de execução judicial em que o devedor, após cumprir por vários anos o contrato cujo pagamento estava fixado em produtos, ficou inadimplente e questionou a fixação do preço em mercadorias.
“Na hipótese concreta, o que se verifica é que, além de não ter sido apontado qualquer vício de consentimento na contratação, a avença foi firmada em 8/4/2002, não havendo notícia de que, antes da oposição dos presentes embargos, em 3/5/2013 – vale dizer, aproximadamente quatro anos após o advento do termo final pactuado –, o recorrente tenha apresentado qualquer insurgência quanto à cláusula que ora se discute.
Entender pela inviabilidade do prosseguimento desta execução, portanto, equivaleria a premiar o comportamento contraditório do recorrente, que, durante mais de metade do período de vigência do contrato, adimpliu sua obrigação nos moldes como acordado (entrega de produto), tendo invocado a nulidade da cláusula tão somente quando em curso o processo executivo que objetivava a satisfação das parcelas não pagas, em clara ofensa à legítima confiança depositada no negócio jurídico pela recorrida.
A boa-fé, no particular, à vista do reconhecimento da prática de conduta contraditória desleal pelo recorrente, tem força para impedir a consequência decorrente da invalidade da pactuação da remuneração do arrendamento em quantidade fixa de produtos”, destacou a Ministra.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça altera a jurisprudência até então estabelecida pelos Tribunais e, contribui para a garantia da segurança jurídica entre os contratantes, além de reconhecer as peculiaridades das relações estabelecidas no setor rural.
A decisão na íntegra da Ministra Nancy Andrighi está disponível aqui.
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Fonte: Sistema FAEP