Agricultores brasileiros estão em busca de apoio para desenvolver um contrato futuro de soja que facilite as negociações entre o Brasil, maior exportador de soja do mundo, e a China, o maior importador, em um momento de tensões comerciais entre norte-americanos e chineses.
Segundo um grupo crescente de produtores, analistas, banqueiros e até mesmo um economista do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, faria sentido estabelecer tal contrato para diminuir riscos, já que os preços da soja do Brasil e dos EUA se descolaram com a intensificação da guerra comercial.
Os prêmios no mercado brasileiro de soja subiram para um recorde de cerca de US$ 2 em relação aos preços da bolsa de Chicago (CBOT), após uma decisão tomada por Pequim de impor uma tarifa de 25% sobre a oleaginosa norte-americana em julho, em retaliação às taxas impostas pelo presidente Donald Trump.
Um contrato futuro é um termo de compromisso de compra ou venda de determinado ativo, a um preço e data pré-determinados. Na prática, ele serve para “travar” os preços a uma determinada cotação e, por isso, funciona como mecanismo de proteção diante de incertezas.
Um novo contrato poderia fornecer uma alternativa à CBOT, referência mundial em preços de soja. A matriz da CBOT, CME Group Inc, não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
Bartolomeu Braz, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), disse que os agricultores gostariam de ver um novo contrato comercializado no Brasil ou na Argentina, o terceiro maior produtor mundial de soja.
Ele discutiu a ideia com o embaixador argentino em Brasília no ano passado e recentemente abordou a questão diante de uma plateia de comerciantes chineses em uma reunião da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o poderoso lobby agrícola no Congresso brasileiro.
“Os próximos passos envolvem a procura de aconselhamento técnico e jurídico para avançar o processo”, disse ele em uma entrevista na semana passada.
Criação do contrato
A criação de tal contrato na bolsa brasileira, a B3, não é complicada e exigiria apenas a definição de padrões relativos a preço, qualidade e quantidade, disse Frederico Favacho, um advogado que representa grupos brasileiros de processamento e exportação de grãos.
Se a guerra comercial continuar e a China quiser garantir a soja sul-americana em janeiro e fevereiro, o prêmio colocado sobre a soja brasileira “teria de ser negociado e ficaria difícil ou impossível de fazer o hedge via CBOT”, disse Dan Basse, economista e presidente da consultoria AgResource, de Chicago.
Os Estados Unidos, o segundo maior exportador de soja do mundo, venderam no ano passado cerca de US$ 12 bilhões em soja para os chineses, enquanto as vendas do Brasil para esse país ficaram um pouco acima de US$ 20 bilhões, segundo dados do governo.
Faz sentido “econômico” procurar um local diferente para comercializar a soja brasileira, disse à Reuters Warren Preston, vice-economista-chefe do USDA, durante uma conferência em São Paulo.
Com interrupções no comércio, flutuações cambiais e diferenciais de transporte aumentando o risco para produtores e compradores, Preston disse que se tornou mais difícil para as pessoas que usam um contrato CME tentar fazer hedge de suas compras e vendas, ou seja, protegê-las da volatilidade.
Em julho, a S&P Global Platts começou a publicar três indicadores do preço da soja denominados SOYBEX CFR China, SOYBEX FOB Santos e SOYBEX FOB Paranaguá.
Enquanto fontes diplomáticas e da indústria chinesas dizem que a ideia de um contrato de soja na América do Sul deva ser explorada, ainda não há apoio incondicional à iniciativa. Qu Yuhui, ministro-conselheiro da embaixada chinesa no Brasil, disse que o conceito de um contrato futuro direto entre o Brasil e a China merece discussão.
“Ambos os lados devem trabalhar na direção de qualquer ideia –como ter os dois lados assinando contratos futuros– que permita ao mercado brasileiro de soja e agricultores saber quanta demanda chinesa haverá no próximo ano e que os compradores chineses saibam que preço eles podem receber do Brasil”, disse ele em uma entrevista no mês passado.
Um alto executivo chinês de empresas de grãos disse que a ideia seria “disruptiva”, tomando emprestado um termo do Vale do Silício para expressar uma mudança positiva.
“A inovação é bem-vinda, já que o mercado está passando por mudanças estruturais e as margens estão apertadas”, disse o executivo, que pediu anonimato por não estar autorizado a falar com a mídia.
Fonte: G1 Agro