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FECHAMENTO DE INSTITUTOS RURAIS

Apoiado pela Assembleia Legislativa, o governador gaúcho José Ivo Sartori (PMDB) extinguiu oito fundações estaduais, colocando no limbo cerca de 1.000 funcionários, sob pretexto de reduzir despesas. Diretamente vinculadas à agricultura e ao meio ambiente, foram extintas a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro) e a Fundação Zoobotânica, ambas com tarefas regionais equivalentes às da Embrapa (pesquisa agronômica) e do Ibama (controle ambiental e da biodiversidade). Mais ainda: com o fechamento da Fundação de Economia e Estatística (FEE), que gera estatísticas, produz indicadores e realiza estudos de avaliação e planejamento de políticas públicas, o governo gaúcho liquida o similar regional do IBGE e do Ipea. As três fundações somadas têm orçamento anual de R$ 90 milhões, ou seja, 0,014% das despesas do Estado, estimadas em R$ 62,7 bilhões em 2017.

De nada adiantaram as manifestações de rua e os protestos de técnicos e cientistas de instituições nacionais e internacionais de pesquisa.

- A partir de agora, o Rio Grande do Sul passa a ser o único Estado agrícola sem pesquisa local – diz o agrônomo Nelson Bertoldo, presidente da Associação dos Servidores da Fepagro. – É um triste exemplo para outros Estados sugestionados pela ideia, errônea,  de que a Embrapa, como cabeça da pesquisa agrícola no Brasil, é capaz de resolver tudo – afirma o agrônomo Orlando Melo de Castro, coordenador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), que comanda seis entidades de pesquisa, entre elas o centenário Instituto Agronômico, fundado em Campinas, em 1887.

Num primeiro momento, o governador Sartori fundiu secretarias e atrasou o pagamento da dívida com a União, consolidada em 1998 e com previsão de acabar em 2028. Em seguida, passou a parcelar os salários do funcionalismo, no qual os inativos representam 54% do total. Até que, no segundo semestre de 2016, admitiu que seria necessário cortar órgãos quase sagrados para o Estado, que se orgulha de suas raízes agrícolas e do pioneirismo em legislação ambiental. Sartori não perdoou nem a Fundação Piratini, que toca a rádio e a TV Cultura, nem a minúscula Fundação de Tradição e Folclore, com apenas nove funcionários. Sobrou apenas a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), que deve absorver o pessoal estável da Zoobotânica.

É exatamente no item RH que a coisa enrosca. Prédios e terrenos podem ser descartados, mas com pessoas é diferente. Poucos dias depois do decreto de extinção, assinado em meados de janeiro, a Justiça do Trabalho suspendeu a eficácia da medida até que sejam negociadas as condições de demissão do pessoal. Em cada órgão extinto, há funcionários regidos pelo estatuto do funcionalismo e outros contratados pela Consolidação das Leis do Trabalho, demissíveis a qualquer tempo. As negociações tendem a ser arrastar ao longo dos seis meses de prazo para que tudo seja liquidado.

A Fepagro é a herdeira das mais antigas estações experimentais gaúchas – a primeira, de 1919, voltada para os colonos da Serra Gaúcha – e possui 21 bases de pesquisa, cujas áreas, em alguns casos, pertencem a prefeituras. Seu pessoal (280 funcionários, sendo 89 mestres ou doutores em diversas especialidades agrícolas) vai para a Secretaria da Agricultura, Pecuária e Irrigação (Seapi), que criou um departamento de “diagnóstico e pesquisa”, mas a experimentação não faz parte de seu modus operandi, totalmente voltado para a fiscalização e a inspeção sanitária. Na Seapi, os egressos da Fepagro fazem parte de um “quadro em extinção”, no qual deverão ficar, sem direito a reajustes de salários, até que atinjam o tempo de aposentadoria.

É uma degola sem precedentes, mas na realidade a Fepagro já vinha perdendo terreno: em anos recentes, ficou fora das principais feiras agropecuárias gaúchas (Expointer e Expodireto), onde mantinha espaços em parceria com a ativa Emater-RS, essencialmente voltada para a agricultura familiar.

- A pesquisa agrícola não dá muito ibope porque o pessoal trabalha em silêncio e os resultados demoram anos para aparecer – explica o veterano Nelson Bertoldo, especialista em sanidade vegetal.

Otimista, ele ainda acredita que o Estado preserve os núcleos de pesquisa em melhoramento de grãos e frutas, sanidade animal, silvicultura e meio ambiente.

Com o arrocho crescente, em 2015 as verbas do orçamento público garantiram os salários (R$ 16 milhões) e o custeio básico (R$ 4 milhões), enquanto mais de 100 projetos de pesquisas eram tocados com recursos extras – R$ 4,5 milhões – obtidos junto a agências de fomento científico.

Segundo Nelson, nos últimos anos a obtenção de financiamentos se tornou bem mais difícil, pois – as universidades se tornaram nossos concorrentes na disputa por verbas para pesquisas. –

FZB

Uma das obrigações da Fundação Zoobotânica é renovar a cada cinco anos a lista de espécies ameaçadas de extinção no RS. Focada na preservação da biodiversidade, mantém o Museu de Ciências Naturais e cuida do Zoológico e do Jardim Botânico de Porto Alegre (36 hectares). A bióloga Josy Matos, presidente da associação dos funcionários, diz que a extinção é mais um passo para o esvaziamento da estrutura de proteção ambiental.

FEE

Na Fundação de Economia e Estatística trabalham 36 doutores e 93 mestres. Entre estes se encontra Rodrigo Daniel Feix, economista com curso técnico de torneiro mecânico e experiência como aprendiz na John Deere. Aos 35 anos, ele coordena o núcleo de estudos do agronegócio, responsável pelo levantamento do valor da produção do setor, que emprega 325 mil pessoas e representa 40% do PIB gaúcho.

ALERTA EM SC

Em 2015, como resultado de um plano de demissão voluntária na Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) e na Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola (Cidasc), saíram muitos funcionários, que não foram repostos. Nos últimos anos, o número de agrônomos atuantes na defesa sanitária vegetal na Cidasc caiu de 120 para 25.

Fonte: Revista Globo Rural



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