“A forma de enfrentar a bancada da bala contra o golpe é ocupar as propriedades deles ainda lá nas bases, lá no campo. E é a Contag, são os movimentos sociais do campo que vão fazer isso. Ontem dizíamos na passeata: vamos ocupar os gabinetes, mas também as fazendas deles. Porque se eles são capazes de incomodar um ministro do Supremo Tribunal Federal, nós vamos incomodar também as casas, as fazendas e as propriedades deles.” Foi com essas palavras nada ambíguas que Aristides Santos, secretário da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), anunciou seu modo de resistir ao impeachment da presidente Dilma Rousseff no dia 1.º. E pregou esse recurso à violência diante da própria Dilma.
Nada diferente daquilo que o presidente da CUT, Vágner Freitas, afirmou, também em evento no Planalto, com a presença de Dilma, em agosto de 2015: “Somos defensores da unidade nacional, da construção de um projeto de desenvolvimento para todos e para todas. E isso implica, neste momento, ir para as ruas entrincheirados, com armas nas mãos, se tentarem derrubar a presidenta”. Disse ainda que “nós seremos um exército” se houver “qualquer tentativa de atentado à democracia, à senhora ou ao presidente Lula”.
O que isso quer dizer? Que Dilma Rousseff não se contenta com promover a negociação do desespero no Congresso Nacional, entregando ministérios importantes para pessoas desqualificadas em troca dos votos para se livrar do impeachment. A conivência da presidente diante de promessas inequívocas de recurso à violência significa que Dilma também quer poder contar com as ameaças dos “movimentos sociais” contra a população que deseja apenas ver a lei ser cumprida. É por essas e outras que não se viu reprimenda quando Guilherme Boulos, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, afirmou, no fim de março, que “não haverá um dia de paz do Brasil. Podem querer derrubar o governo, podem prender arbitrariamente o Lula ou quem quer que seja, podem querer criminalizar os movimentos populares, mas achar que vão fazer isso e depois vai reinar o silêncio e a paz de cemitério é uma ilusão de quem não conhece a história de movimento popular neste país (…) Este país vai ser incendiado por greves, por ocupações, mobilizações, travamentos. Se forem até as últimas consequências nisso não vai haver um dia de paz no Brasil”.
O que está em jogo aqui não é a capacidade real destes movimentos de cumprir as promessas que fazem – ainda que se trate de bravata, as meras ameaças já são graves o suficiente e merecem a devida contestação legal. Mas o maior escândalo nisso tudo é ver que Dilma e o petismo não mexem um dedo para conter os ânimos paramilitares dos tais “movimentos sociais”. Manter esse tipo de dúvida sobre a população e os parlamentares – “Haverá conflitos nas ruas?” “Minha propriedade corre risco?” – é apenas uma estratégia a mais para Dilma se manter agarrada à cadeira presidencial, assim como comprar votos entregando cargos, assim como repetir infinitamente que há um “golpe” em curso no país. O recurso à violência foi trivializado pelo petismo.
O discurso de Dilma logo após a fala incendiária de Aristides Santos parece uma tentativa de esfriar os ânimos. Mas só parece. “Nós não defendemos qualquer processo de perseguição de qualquer autoridade porque pensa assim ou assado. Não defendemos a violência, eles exercem a violência, nós não.” “Eles”, no caso, são a oposição, apesar de ainda estar para aparecer um equivalente oposicionista de Boulos, Santos ou Freitas, alguém prometendo colocar fogo no país como fazem os três líderes defensores de Dilma. E anos e anos de petismo no poder já deixaram claro que, para o petismo, invasões de terra ou de prédios não são mesmo violência, não são atentado à lei: são apenas “justiça social”.
Editorial publicado no jornal Gazeta do Povo de 08/04/2016
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Fonte: Sistema FAEP