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DÍVIDA DO FUNRURAL

Um parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão jurídico do Ministério da Fazenda, frustrou as expectativas da bancada ruralista de obter um perdão de R$ 17 bilhões em débitos de produtores pessoas físicas junto ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). Segundo o documento, a resolução aprovada pelo Senado Federal, que pretendia livrar o setor da dívida, não tem efeito sobre a lei de 2001, que instituiu novamente a cobrança da contribuição sobre a comercialização da produção.

O trecho em questão da Lei nº 10.256/2001 foi inclusive declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em março deste ano – decisão que gerou o passivo bilionário. Diante da posição da PGFN, a bancada ruralista vai agora traçar nova estratégia, que pode envolver mudanças nas condições de parcelamento das dívidas. Em meio à tramitação da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, o governo já precisou aceitar conceder condições mais benéficas a devedores na MP 783, do Refis.

Para solucionar o passivo dos produtores, o governo editou a Medida Provisória (MP) 793 para criar um programa de parcelamento aos devedores, com pagamento de entrada de 4% da dívida neste ano e descontos de 100% nos juros e 25% nas multas a partir de 2018. Isso significa uma disposição de abrir mão de R$ 7,6 bilhões ao longo de 15 anos (180 meses) – quase metade da dívida que a União ganhou o direito de cobrar.

O programa foi costurado em uma longa negociação que começou ainda em abril. Mesmo depois de criado o parcelamento, a bancada ruralista fez nova investida, desta vez para tentar anistiar os produtores perante o Fisco. A resolução, de autoria da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), ligada ao setor ruralista, foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e promulgada pelo presidente do Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE).

A fragilidade do governo diante da apresentação da segunda denúncia contra Temer elevou a pressão da bancada ruralista para que o governo desistisse de recorrer ao STF contra a resolução. A demora na atuação da AGU causou preocupação na área técnica do governo, que via risco de a medida abrir um precedente perigoso para as contas públicas. Diante do imbróglio, que afetou as adesões ao parcelamento, o prazo para o pedido de ingresso no programa foi prorrogado até 30 de novembro.

Com a posição da PGFN, a bancada agora vai “trabalhar a MP”, disse a relatora, deputada Tereza Cristina (PSB-MS). Desde a edição da medida, a bancada tenta emplacar um pagamento de entrada menor (de 1% da dívida), prazo maior (240 meses) e desconto mais generoso nos valores das multas.

O parecer da PGFN ainda chama a atenção dos senadores para a impossibilidade de uma resolução suspender a recente decisão do STF. Segundo o documento do órgão jurídico, a medida aprovada pelo Senado anula apenas as leis de 1991, 1992 e 1997 que se referiam ao Funrural. Elas também foram declaradas inconstitucionais pelo Supremo.

No entanto, o parecer lembra que o STF, como “intérprete máximo da Constituição”, decidiu pela legalidade da cobrança a partir de 2001. “Interpretação de que o ato do Senado seria capaz de projetar seus efeitos sobre a contribuição do empregador rural pessoa física com base na Lei nº 10.256 de 2001 significaria sem dúvida desprezar por completo a tese firmada pelo STF, que assentou a constitucionalidade formal e material da referida tributação”, diz o documento.

A PGFN vai além e diz ainda que a resolução é um instrumento “político-jurídico” que não pode extravasar os seus fins constitucionais – neste caso, o de ratificar uma posição do Supremo, não de afrontá-la.

- Decerto, admitir a suspensão em absoluto dos dispositivos mencionados na resolução, sem interpretá-los dentro dos lindes da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF, seria atribuir ao instituto da resolução do Senado o efeito de inovar a ordem jurídica, sem a observância do processo legislativo típico, o que, à toda evidência, seria inadmissível – diz o parecer.

O órgão jurídico da Fazenda ainda passa um recado e lembra que “não cabe ao Poder Legislativo imiscuir-se no juízo sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade das leis em vigor, nem mesmo interpretar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade”. O documento é assinado pela procuradora da Fazenda Nacional Geila Lídia Barreto Barbosa Diniz e ratificado pelo procurador-geral da Fazenda Nacional, Fabricio da Soller.

Fonte: Estadão



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