A última década foi marcada pelo boom das commodities, época em que as cotações desses produtos alcançaram patamares historicamente altos. No início da última década, os preços das commodities entraram em uma tendência de alta, atingindo seu maior valor, em 2011. A partir de então, os preços das commodities começaram a se retrair, aprofundando essa queda, principalmente, a partir do primeiro semestre de 2014.
Crescimento econômico mundial e preços das commodities
Na tentativa de explicar esse fenômeno de alta e, agora, de queda das cotações das commodities, analistas tendem a colocar toda a “culpa” no crescimento econômico mundial e, mais especificamente, no da China. Isto é, utilizam-se da ideia de que os preços das commodities se elevaram, na última década, exclusivamente, por conta do aumento da demanda agregada, proveniente de um maior crescimento da economia mundial e, principalmente, da chinesa.
Apesar dos fundamentos microeconômicos (oferta e demanda) terem grande influência no comportamento dos preços das commodities, eles não atuaram sozinhos. Isso pode ser constatado pelo fato de que as cotações das commodities atingiram seu pico histórico entre 2008 e 2011, justamente na época em que a economia mundial enfrentava sua pior crise desde 1929. Do mesmo modo, a cotação das commodities começou a se retrair a partir de 2011, aprofundando essa queda em 2014, sendo que o crescimento médio mundial entre 2012 e 2015 (3.6% a.a) foi maior do que entre o período de 2008 e 2011 (2,9%).
Da mesma forma, o aumento da demanda agregada proveniente do maior crescimento das economias emergentes, sobretudo, da China, também não explica, sozinho, o bom das commodities na última década. Isso pode ser verificado ao constatar que, entre 2002 e 2008, as economias emergentes apresentaram um crescimento médio anual (6.3% a.a.) superior ao do período entre 2012 e 2015 (5.2%), no entanto, as cotações das commodities atingiram valores maiores entre 2012-2015 do que entre 2002-2008.
E a atividade financeira?
Os fundamentos econômicos, portanto, não explicam toda a história do aumento dos preços das commodities na última década. Outro ponto muito importante para explicar esse momento é a atividade financeira.
Assim, como os títulos públicos e as ações, as commodities são um tipo de ativo financeiro e, por isso, uma opção de investimento. Ou seja, quando há uma maior perspectiva de retorno das commodities, por conta, por exemplo, de uma maior demanda agregada por esses produtos, os investidores passam a procurar esse tipo de ativos, em detrimento dos instrumentos financeiros tradicionais (títulos públicos e privados, moedas e ações). E foi exatamente isso que ocorreu a partir de 2008, com a eclosão da crise econômica mundial.
Os Estados Unidos, procurando estimular sua economia, muito abalada pela crise, reduziram seus juros para um nível consideravelmente baixo (uma “banda” entre 0% e 0.25% a.a.), fazendo com que os investidores migrassem seus recursos financeiros para as commodities. Assim, mesmo com a desaceleração da economia mundial, a cotação das commodities atingiu níveis historicamente elevados.
Voltando à normalidade
A manutenção da taxa de juros norte-americana em patamares baixos foi um fator muito importante para o boom das commodities verificado na última década. No entanto, esse fator, muito provavelmente, não deverá estar presente nos próximos anos, talvez, até mesmo, ainda nesse ano.
Ou seja, com a recuperação da economia norte-americana, há expectativa de aumento da taxa de juros nos próximos meses, o que fará com que a oferta de dólares no mercado mundial se reduza, tornando a moeda dos Estados Unidos cada vez mais valorizada. No entanto, é importante ressaltar que o aumento da cotação do dólar nos últimos meses, principalmente a partir de primeiro semestre de 2014, já representa uma antecipação, por parte dos agentes do mercado, desse provável aumento da taxa de juros norte-americana.
Assim, com o aumento da taxa de juros, os recursos dos investidores tendem a voltar para as economias centrais, sobretudo, para os Estados Unidos, em busca de ativos financeiros mais tradicionais, em detrimento dos ativos relacionados às commodities.
Portanto, o boom das commodities nos últimos anos é explicado tanto pelos fundamentos da economia, como pelos movimentos da atividade financeira. Dessa forma, para os próximos anos, o que se espera é que as cotações das commodities mantenha a sua trajetória de queda, iniciada em 2011, uma vez que, além do desaquecimento da economia chinesa, que deverá fazer com que a demanda agregada cresça com uma velocidade menor do que anteriormente, deverá ter o aumento da taxa de juros norte-americana. No entanto, é importante ressaltar que esses dois movimentos não representam uma crise, mas sim a volta da economia mundial à sua normalidade.
Colaborou a economista pela USP e aluna do Mestrado Profissional em Agronegócio da FGV (MPAgro), Roberta Possamai.