As commodities agrícolas negociadas nas Bolsas de Nova York (ICE Futures US) e Chicago (CBOT) iniciarão o ano em níveis mais baixos que os de 2017. A pressão vem de fatores relacionados à política monetária dos Estados Unidos e também aos fundamentos que, no caso dos grãos, é baixista. Investidores estão atentos ao aumento gradual dos juros básicos norte-americanos.
Em dezembro, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) aumentou as taxas em um quarto de ponto porcentual, para 1,25% a 1,5%, no terceiro ajuste positivo apenas em 2017. Para 2018, a instituição financeira prevê mais três aumentos, o que tende a fortalecer o dólar. A moeda mais atrativa rouba espaço das commodities no mercado global e, no caso dos EUA, reduz a competitividade de seus produtos.
Para o Brasil, porém, o fortalecimento da moeda americana gera oportunidades e as eleições presidenciais em 2018 podem contribuir para isso.
- O aumento de juros no mercado norte-americano é, sem dúvida, o principal fator baixista na ICE – diz o diretor da Archer Consulting, Arnaldo Luiz Corrêa, lembrando que participantes tendem a abandonar ativos de maior risco para depositarem suas apostas na moeda, o que pressiona as commodities.
O desempenho do petróleo também influencia. Hoje há pressão sobre os preços do combustível fóssil pela elevação dos estoques de gasolina nos Estados Unidos, que, contudo, é contrabalançada pela extensão no acordo de corte da produção global do óleo até o fim de 2018. O ativo mais sensível a estas oscilações é o açúcar, que divide a competitividade com o etanol. Este pode ter seus preços diretamente atrelados ao petróleo no próximo ano.
- A combinação entre petróleo e câmbio dará o tom para as cotações -
Ainda em Nova York, os mercados de café e de algodão serão mais influenciados pelas relações entre estoque, oferta e demanda. No caso do café, o diretor da Comexim nos EUA, Rodrigo Costa, espera preços firmes no primeiro trimestre, mas à medida que a nova safra brasileira, que deve ser maior que a de 2017, comece a ser ofertada, a partir do segundo semestre, a tendência é de cotações mais fracas.
Costa considera que não há espaço para perdas em produção de café no mundo. Segundo ele, as cotações já descontaram o otimismo das ofertas, principalmente do Brasil. O consumidor, por sua vez, percebe a necessidade de garantir uma cobertura de compras no mercado físico.
- O consumo mundial tem necessidade anual de cerca de 3 milhões de sacas de 60 kg a mais de café – diz.
Os fundos de investimento, com posição vendida recorde, podem ser forçados a recomprar parte desse volume, favorecendo os preços.
- As apostas em novas mínimas no mercado de café devem ser pelo enfraquecimento das moedas dos países produtores – afirma.
No caso do algodão, os contratos podem ter sustentação no curto prazo pelo quadro de oferta restrita no mercado. Segundo o consultor em gerenciamento de risco da INTL FCStone, Éder Silveira, embora a safra de algodão dos EUA, maior exportador mundial, deva ser volumosa, boa parte ainda não está beneficiada. E o momento é de demanda mais forte na Ásia após quebras de safra na Índia e no Paquistão.
O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) elevou em dezembro sua projeção para as exportações norte-americanas de 14,5 milhões de fardos para 14,8 milhões de fardos (de 3,16 milhões para 3,22 milhões de toneladas) e reduziu a expectativa de reservas domésticas da pluma de 6,1 milhões para 5,8 milhões de fardos (1,33 milhão para 1,26 milhão de toneladas) em 2017/2018. Mesmo assim, o estoque é superior ao observado no fim do ciclo passado, e o impulso às cotações pode perder força no decorrer de 2018.
Grãos
Na Bolsa de Chicago (CBOT), dados sobre oferta e demanda costumam preponderar sobre questões macroeconômicas na visão dos investidores.
- As pressões previstas para 2018 virão de safras amplas nos principais países produtores, estoques altos e demanda aquecida, ainda que insuficiente para manter os preços sustentados – explica o analista da ARC Mercosul baseada em Chicago, Tarso Veloso.
A China, maior comprador de soja do mundo, continuará comprando ao redor de 100 milhões de toneladas por ano. Mas os fornecedores se prepararam: os EUA devem colher safra recorde de soja e a Argentina também deverá ter incremento. O Brasil tende a ofertar 4% menos, por causa de problemas climáticos no início do ciclo, mas essa redução não é suficiente para tirar o peso das reservas globais da commodity sobre os preços.
- Os estoques mundiais são muito amplos. Sem um problema climático maior na América do Sul, fica difícil ter muito otimismo para a bolsa no ano que vem – ressalta o especialista da ARC.
Atualmente, a consultoria de Chicago tem recomendado hedge de 40% da safra norte-americana de soja a US$ 10,20 por bushel considerando o contrato que vence em novembro de 2018. Veloso explica que as condições climáticas podem trazer volatilidade aos preços mas, como a tendência é de baixa, 40% da produção comercializada garantiria rentabilidade atrativa para o produtor.
Além dos fundamentos de oferta e demanda e do movimento do dólar no exterior, a relação entre a moeda norte-americana e o real deve ser monitorada por investidores. Principalmente na soja e, em menor grau no milho – o Brasil se consolidou como importante exportador -, as oscilações do câmbio com a corrida eleitoral no Brasil devem influenciar os preços em Chicago.
Para o analista Pedro Dejneka, sócio da MD Commodities, em momentos de repique de câmbio, a soja, em especial a brasileira, pode ficar mais competitiva. Na avaliação do analista, o ponto de equilíbrio do câmbio no Brasil está entre R$ 2,80 a R$ 3,20; o dólar próximo de R$ 2,80 reduziria o potencial exportador de alguns produtos e acima de R$ 3,10 não favoreceria a economia brasileira como um todo.
- Mas se a gente tiver um repique a R$ 3,50 ou mais vai ajudar o Brasil a exportar. Em ano de eleição tudo pode acontecer – disse.
O analista não acredita, entretanto, que o dólar se sustentará por longos períodos acima de R$ 3,50. Ele avalia que, se a moeda norte-americana avançar além desses patamares, o governo brasileiro tem ferramentas para conter o sobressalto.
- O Brasil tem a sétima maior reserva de dólares do mundo. Apesar de não usar essa reserva para compensar a alta do dólar, num período de emergência, para tentar evitar a disparada da inflação e a necessidade de elevar taxas de juros, nós não duvidamos que ela poderia ser utilizada. -
Para o analista Stefan Tomkiw, do Banco Société Générale, o câmbio deve continuar sendo um fator relevante na formação dos preços em Chicago.
- Se o dólar se valorizar acabará tirando a atratividade da soja norte-americana e levando a demanda para outros lugares. A movimentação da moeda vai, em alguns momentos, direcionar a procura para determinada origem. -
Fonte: Estadão Conteúdo