Bebidas de cereais com bactérias pró-bióticas é o mais novo resultado da pesquisa em processamento de alimentos da Embrapa. Originalmente, o processo foi desenvolvido para a fabricação de bebidas de soja fermentadas, resultando em testes piloto que indicaram a adequação da tecnologia para bebidas de aveia, milho, quinoa, centeio, cevada e trigo. O produto não contém leite, mas sua produção utiliza equipamentos empregados em laticínos. Outra vantagem é que a bebida apresenta propriedades funcionais, por conter bactérias pró-bióticas benéficas à saúde.
O produto é fruto do trabalho de pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e procura parceiros em todo o País para chegar às prateleiras dos supermercados. A Gestão Láctea, empresa de consultoria e assistência técnica especializada na área de laticínios, vai assinar com a Embrapa um contrato de cooperação técnica, durante a feira Minas Láctea 2015, que acontece até 16 de julho, em Juiz de Fora (MG).
- A ideia é que a Gestão Láctea atue em conjunto com a equipe de transferência de tecnologia da Embrapa, identificando empresas potenciais com interesse comercial na fabricação das bebidas. A partir disso, serão conduzidos testes para validação da tecnologia de fermentação por pró-bióticos, a fim de realizar adequações específicas e obter o produto-teste para o mercado – relata André Dutra, analista da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Equipamentos de laticínios adaptados
As bebidas fermentadas pró-bióticas foram produzidas a partir de insumos e equipamentos tipicamente usados em laticínios. Utilizam como matéria-prima extratos em pó dos cereais, em vez do processo tradicional que parte do grão, podendo ser adicionadas de preparados de frutas como banana, maçã e mamão. O prazo de validade estimado do produto sob refrigeração é de até dois meses.
- A principal contribuição da pesquisa foi enfatizar a viabilidade de produção de diferentes bebidas com pró-bióticos utilizando a atual estrutura dos variados laticínios distribuídos pelo País – ressalta o líder do projeto Eduardo Walter, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos, para quem a tecnologia é uma oportunidade de ampliar a capacidade produtiva de empresas do setor de laticínos e de diversificar as bebidas ofertadas ao consumidor, utilizando a logística existente.
- Novos empreendedores também podem contratar os laticínios para produção das bebidas, sem precisar construir uma fábrica ou investir em equipamentos – projeta o pesquisador.
Alimentos pró-bióticos
O processo tecnológico desenvolvido pela Embrapa para a produção de bebidas fermentadas pró-bióticas emprega diferentes cepas de bactérias, incluindo Bifidobacterium animalis subespécie lactis e Lactobacillus acidophilus, culturas comerciais disponíveis no mercado. O desenvolvimento das bebidas pró-bióticas foi realizado nas fábricas-piloto de processamento da Embrapa Agroindústria de Alimentos, mas as bebidas também podem ser elaboradas de forma artesanal, ou seja, em casa, com o uso de diferentes iogurteiras domésticas.
A Embrapa também vem selecionando bactérias com potencial pró-biótico. Uma delas, da espécieLactobacillos rhamnosus, proveniente de queijo coalho artesanal, apresentou diversas propriedades promissoras, como ação antimicrobiana em animais. Essa bactéria já integra a Coleção de Microorganismos de Interesse da Embrapa Agroindústria Tropical.
- Estamos trabalhando em conjunto para buscar bactérias que se destaquem por propriedades relacionadas à saúde e que sobrevivam a condições simuladas do trato gastrintestinal humano, sendo potencialmente interessante para a redução do risco de doenças – conclui Karina Olbrich, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
As bactérias pró-bióticas contribuem para o equilíbrio da flora intestinal, e os cereais possuem compostos bioativos benéficos à saúde. A soja, por exemplo, é um alimento consumido há milhares de anos e seu consumo vem sendo associado à redução do risco de câncer, da osteoporose e dos sintomas da menopausa.
- A bebida pró-biótica à base de soja, por exemplo, não foi desenvolvida para nichos específicos de consumidores, mas é particularmente interessante aos indivíduos que tenham restrição ao consumo de lácteos, pois pode ser consumida por pessoas que apresentam alergia às proteínas do leite ou intolerância à lactose – relata a integrante da equipe Ilana Felberg, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos e especialista em produtos derivados de soja.
Bactérias benéficas à saúde
Os pró-bióticos são definidos pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e pela Organização Mundial da Saúde (WHO) como microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro. No Brasil, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os pró-bióticos aprovados para aplicação em alimentos podem inserir alegação de propriedade funcional no rótulo do produto: “contribui para o equilíbrio da flora intestinal”.
A importância da microbiota intestinal para a saúde humana tem sido demonstrada por várias evidências científicas. Pesquisadores têm encontrado relação entre a atividade de bactérias intestinais e marcadores metabólicos associados à obesidade, doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2. Trabalhos científicos revisados pelo grupo de especialistas em pró-bióticos reunidos pela FAO/WHO relatam a atuação dos pró-bióticos em funções imunológicas, digestivas e respiratórias, e indicam efeito no alívio de doenças infecciosas em crianças e outros grupos de risco. Também é reconhecida a importância desses microrganismos na modulação do sistema imunológico.
No Brasil, já foram iniciados testes in vitro e in vivo para avaliar os benefícios da ingestão regular de alimentos pró-bióticos. Um recente estudo realizado em colaboração com a Universidade Federal de Viçosa revelou que uma bebida pró-biótica fermentada à base de leite caprino é eficiente no controle de diabetes tipo 2.
- A ingestão regular da bebida pró-biótica como parte da dieta habitual dos participantes resultou em uma significativa melhora do controle glicêmico em diabéticos. Contudo, ainda é preciso a realização de mais testes para ampliar a validação desse resultado – afirma a pesquisadora Karina Olbrich, da Embrapa Agroindústria de Alimentos, co-orientadora do ensaio clínico conduzido pela Dra. Lívia Tonucci.
Os alimentos pró-bióticos, por seus potenciais benefícios à saúde, apresentam uma previsão de crescimento no mercado mundial de 6,8% anualmente até 2018, devendo alcançar US$ 44,9 bilhões em 2018, segundo o relatório Global Industry Analysis, do Transparency Market Research (TMR). A publicação Brasil Food Trends 2020 evidencia que as transformações no comportamento do consumidor em busca de uma alimentação voltada para a saúde e bem-estar devem se refletir na indústria de alimentos, com a elaboração de novos ingredientes, processos e embalagens que integrarão produtos com diferenciais competitivos.
Para a indústria de alimentos, os pró-bióticos apresentam uma oportunidade real de agregação de valor a produtos já consumidos pela população. Segundo o estudo Probiotics Market de 2013, mais de 500 produtos pró-bióticos foram lançados na última década. Em consequência do crescimento global do mercado de alimentos pró-bióticos, o mercado de culturas pró-bióticas também está em expansão. Um número reduzido de empresas multinacionais de origem europeia divide o mercado global. Por outro lado é interessante observar, na Europa, o surgimento de empresas de pequeno e médio porte com atuação regional nesse mercado, inclusive startups que comercializam novas cepas bacterianas pró-bióticas.
Fonte: Embrapa
Fotos: Tomas May/Embrapa