As cultivares de arroz de grão preto SCS 120 Ônix e de grão vermelho BRS 902 são as que contêm os maiores teores de compostos bioativos, sendo as mais eficientes em neutralizar radicais livres. Essa é a conclusão dos testes realizados pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em parceria com a Embrapa Arroz e Feijão (GO), com o objetivo de identificar a presença de compostos capazes de prevenir o envelhecimento das células do organismo humano.
A pesquisa comparou amostras do grão integral cozido de quatro cultivares de arroz colorido. Usando método laboratorial para obter extratos fitoquímicos do conteúdo das amostras, o estudo isolou o fenol, um tipo de composto conhecido nos alimentos ligado à atividade antioxidante. Ele se apresenta sob duas formas: a primeira, livre; e a segunda, complexada. Para ambas, foram medidas as concentrações.
Compostos fenólicos são moléculas presentes em alimentos de origem vegetal. A maior ingestão dessas estruturas químicas pode aumentar a eficácia da sua função protetora contra danos oxidativos, ligados ao envelhecimento, nas células. Esses compostos protegem as células ao promover o sequestro dos chamados radicais livres, moléculas que em grande quantidade podem danificar células sadias (veja quadro no fim da matéria). Os compostos fenólicos são categorizados como livres ou compostos, quando são associados a açúcares e proteínas.
Seis vezes mais compostos fenólicos
O melhor resultado para compostos fenólicos livres foi o da cultivar BRS 902 de grão vermelho. Já para os compostos fenólicos complexados, o alcance mais promissor ocorreu com a SCS 120 Ônix (grão preto). Comparativamente, essas cultivares apresentaram 14% mais compostos fenólicos livres do que as outras variedades em teste com menor teor. Na avaliação dos compostos fenólicos complexados, o resultado foi 17% a mais no grão preto. Se comparadas ao arroz branco, em média, as cultivares de grão colorido possuem seis vezes mais compostos fenólicos.
Para medir a atividade antioxidante, os extratos de compostos fenólicos, em suas duas formas, foram testados em laboratório quanto à capacidade de reação e sequestro de radicais livres por dois métodos denominados pelas siglas DPPH e ABTS.
História dos grãos coloridos
O arroz colorido é originário da China, onde é cultivado há mais de quatro mil anos e está associado a tradições cerimoniais e culturais. Em países do sudeste asiático, o grão preto é conhecido como arroz roxo, arroz proibido, arroz do paraíso e arroz do rei. Entre suas origens, havia variedades que eram reservadas apenas ao consumo de imperadores.
No Brasil, o grão preto possui uma história recente de cultivo e de consumo, sendo um marco para a cultura o lançamento da primeira cultivar, a IAC 600, desenvolvida pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC) em 2001.
Diferentemente, o arroz vermelho é o mais antigo em cultivo no mundo e o primeiro a chegar ao País, plantado desde o século 16, introduzido pelos portugueses no início da nossa colonização. Atualmente, o cultivo desse tipo de arroz está concentrado no Semiárido nordestino, único território conhecido em todo o Hemisfério Ocidental onde ainda continua sendo plantado e ingrediente cativo, ao lado do feijão-verde, de vários pratos nos estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Bahia.
As cultivares SCS 120 Ônix e BRS 902 foram desenvolvidas pela Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) e pela Embrapa, respectivamente.
Para a responsável pela pesquisa de tipos especiais de arroz da Epagri, Ester Wickert, as cultivares de grão colorido são um diferencial atrativo para o rizicultor.
“Grãos de pericarpo colorido, preto ou vermelho, têm maior valor de mercado, até porque têm uma produção menor, em termos de área, mas não de produtividade, e têm seu consumo associado à melhor qualidade de vida, uma vez que oferecem maior quantidade de compostos fenólicos, considerados importantes agentes antioxidantes”, diz Wickert.
Trabalhando na Estação Experimental em Itajaí (SC), ela considera também que há espaço para variedades de arroz colorido em diferentes formatos de grão: longo-fino, longos, curtos ou arredondados, associados ainda a características de aroma e teor de amilose.
De acordo com a cientista, o aumento da demanda por grãos de arroz com atributos especiais é um dos motivos que fez com que a Epagri desenvolvesse variedades de grão colorido, adaptadas às condições de cultivo de Santa Catarina, cujo sistema de produção é formado essencialmente por pequenas propriedades com mão de obra familiar.
Mais valorizado que o arroz branco
O arroz de grão colorido está ligado a nichos de mercado, sendo comercialmente mais valorizado do que o arroz branco tradicional. Para impulsionar o setor, falta ainda que o consumidor conheça melhor as características funcionais desses grãos para a saúde e bem-estar, além de aumentar a disponibilidade desses produtos no mercado, oferecendo mais opções de cultivares adaptadas às diferentes regiões brasileiras de cultivo.
Origem genética da cor
A coloração natural do grão integral de arroz existe por causa do predomínio de dois grupos de substâncias: as antocianinas (no arroz preto) e as proantocianidinas (no arroz vermelho), que pertencem à classe química dos compostos fenólicos, ou seja, cor e saúde estão juntas, andando de mãos dadas.
A origem dessas pigmentações é de natureza genética, controlada por genes localizados nos cromossomos 1 e 4 do genoma do arroz. A literatura científica entende que a coloração está ligada à defesa da planta contra agentes causadores de doença e pragas, além de contribuir em funções fisiológicas da semente, como maturação e dormência. Os pesquisadores acreditam que o arroz branco seja uma derivação do grão colorido.
O pesquisador José Manoel Colombari Filho, coordenador do programa de melhoramento de arroz especial da Embrapa, explica que o arroz colorido recebe destaque pela atratividade de seus grãos, pois somente ele pode agregar a cor como um quinto atributo de qualidade à elaboração de pratos diferenciados, já que a diversificação de formatos, sabores, aromas e texturas também é encontrada no arroz integral não colorido.
“É por isso que, atualmente, a demanda pelo arroz colorido está crescendo rapidamente. Esse produto é muito atrativo a consumidores que apreciam a alta gastronomia e novas experiências gastronômicas, como também àqueles que buscam uma alimentação saudável, associada muitas vezes à produção orgânica, com alimentos ricos em propriedades nutracêuticas que favorecem a longevidade, com atividades antioxidante, anticarcinogênica, antialérgica, anti-inflamatória e hipoglicêmica”, diz Colombari.
De acordo com o cientista, não existem dados oficiais sobre a dimensão do mercado de grãos especiais no País, mas estima-se que seja de cerca de 1% e que poderá dobrar de tamanho nos próximos três anos. Os grãos coloridos são comercializados com valores pelo menos cinco vezes acima do arroz branco.
Colombari conta ainda que a pesquisa da Embrapa já está desenvolvendo cultivares de arroz colorido de alto potencial agronômico e com qualidade de grãos que agregue ainda mais valor ao produto nacional: “Se por um lado, no plano nacional, essa realidade acaba conferindo ao arroz colorido o caráter de produto agrícola de nicho de mercado, por outro lado, o mesmo produto poderá abrir oportunidades para o Brasil explorar mercados externos”.
A Embrapa já desenvolveu duas cultivares de grão vermelho, BRS 901 e BRS 902, e, em breve, há a previsão de lançamento da primeira cultivar de grão preto.
Ação de radicais livres
O corpo gera energia a partir da respiração celular, quando ocorre o consumo de oxigênio e ao mesmo tempo a oxidação de combustíveis celulares, como a glicose e ácidos graxos. Esse metabolismo gera subprodutos, conhecidos como radicais livres. Essas moléculas são instáveis e quimicamente reativas e podem ter como efeitos indesejáveis o envelhecimento celular.
No entanto, o organismo humano dispõe de um sistema de desintoxicação do excesso de radicais livres, capaz de neutralizar suas ações prejudiciais. E o melhor é que existem substâncias que podem ajudar nessa tarefa. Por exemplo, compostos fenólicos vindos da ingestão de alimentos possuem função protetora contra danos oxidativos. Quanto maior a ingestão de alimentos que auxiliem nesse processo, menor será o envelhecimento celular.
Fonte: Embrapa