A floresta esconde muitos perigos e o extrativista precisa estar atento a procedimentos preventivos para garantir segurança na atividade. Na coleta da castanha-do-brasil, entre os meses de dezembro a março, os riscos de acidente aumentam durante a queda dos ouriços, frutos que pesam em média 500 gramas e caem de uma altura de até 50 metros, podendo causar ferimentos graves ou a morte do coletor. Há mais de duas décadas a Embrapa orienta comunidades extrativistas do Acre com foco na adoção das Boas Práticas no manejo da castanha, incluindo cuidados para reduzir riscos de acidentes. e garantir segurança na coleta e outras etapas do trabalho.
Morador do Seringal Filipinas, na Reserva Extrativista Chico Mendes, no município de Epitaciolândia, Valderi Martins, de 67 anos, coleta castanha desde a infância e, embora nunca tenha sofrido nenhum acidente, considera que o perigo é constante.
“Susto já tive muitos. A gente junta os ouriços e, de repente, cai um bem do nosso lado. Nunca se sabe quando ele vem”, conta.
Para Severino Brito, de 63 anos, outro extrativista que também já passou por situações de risco, o grande problema é que o ouriço cai sem bater nos galhos da castanheira.
“A queda é direta, do talo até o chão. Se atingir alguém, o estrago pode ser grande”, afirma.
Uso de equipamentos de proteção
O trabalho desenvolvido pela Embrapa em comunidades da Reserva Extrativista Chico Mendes, envolve diferentes etapas do manejo da castanha-do-brasil, desde o mapeamento de castanhais para planejamento da produção até a adoção de boas práticas. Segundo a pesquisadora Lúcia Wadt, no caso da coleta e quebra dos ouriços na floresta, os riscos são inúmeros, mas, por ser uma atividade tradicional, os extrativistas convivem naturalmente com o perigo. O uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) como capacete, luva, calça, camisa de manga comprida e bota de cano longo ou perneira é uma das principais recomendações para tornar a atividade mais segura.
“Os extrativistas reconhecem a importância do EPI, mas muitos ainda não adotam essa prática. É preciso um longo processo de conscientização sobre a importância desse uso. Tentamos mostrar que os EPIs podem salvar vidas e quando visitamos as comunidades sempre utilizamos esses equipamentos de proteção, para mostrar que é preciso se proteger”, diz a pesquisadora.
As Boas Práticas no manejo da castanha-do-brasil, recomendadas pela Embrapa estão disponíveis em cartilhas e instrutivos. Para saber mais sobre o assunto, acesse aqui.
Outros cuidados
No Acre, a safra da castanha começa em dezembro e segue até março. A orientação da pesquisa é que os extrativistas evitem entrar na mata no início da produção, quando a incidência de queda dos ouriços é maior. Ao iniciar a coleta, a recomendação é amontoar os ouriços fora da copa das castanheiras para depois quebrar os frutos.
“Sempre tem um ouriço por cair. Por isso, procuramos coletar a castanha da metade para o fim do período da safra e fazer o monte de ouriços fora da copa da castanheira. Também costumamos observar se os frutos que estão no chão têm aparência de “novo”, ou seja, não absorveram umidade do solo também contribui pa. Isso indica que caíram há pouco tempo e é sinal que a castanheira ainda está em pico de queda. Nesse caso, é melhor esperar alguns dias e coletar depois que a castanheira arriar, ou seja, soltar a maior parte dos ouriços”, ressalta Severino Brito.
Além desses cuidados, conforme a pesquisadora Lúcia Wadt, é importante não realizar o trabalho de coleta em períodos de chuva e, em caso de temporal na mata, não é procurar abrigo embaixo de castanheiras.
Apesar dos riscos potenciais, de acordo com estudos sobre o extrativismo da castanha na Amazônia, acidentes fatais envolvendo ouriços de castanha não são comuns. Entretanto, o perigo não vem apenas do alto. Durante a coleta, os extrativistas percorrem o carreador (caminho que dá acesso às castanheiras), fazendo os motes de ouriços e, depois, retornam para realizar a quebra. Nesse intervalo de tempo, insetos e animais peçonhentos, como cobras, formigas e lacraias, podem se abrigar entre os frutos. O uso de luvas e perneiras nessa etapa é indispensável para evitar acidentes na atividade.
Outra ferramenta muito utilizada pelos extrativistas é a mão-de-onça ou pé-de-bode, um pedaço de pau tripartido na ponta que permite coletar o ouriço e jogar no paneiro (cesto pendurado nas costas para carregar os frutos) com segurança e agilidade. A ferramenta tradicional evita o agachamento e o contato direto com o ouriço e com o solo, o que previne acidentes de trabalho.
Infraestrutura
Estruturar a produção é tão importante quanto a adoção de boas práticas para garantir a manutenção da atividade de coleta da castanha-do-brasil. No Seringal Porvir, desde 2018 40 famílias recebem o apoio do “Projeto Castanhal”, executado pela Associação Wilson Pinheiro, em parceria com a Embrapa Acre e Projeto Bem Diverso. As ações têm como foco investimentos em infraestrutura para melhoria da coleta da castanha e logística de transporte da produção. Entre as atividades realizadas está a entrega de kits de EPI para os extrativistas, para prevenção de acidentes.
O projeto Castanhal também investe na construção de armazéns, estruturas indispensáveis para as Boas Práticas na etapa de pós-colheita da produção. Lúcia Wadt explica que a comunidade Porvir é referência no manejo da castanha, mas os extrativistas não conseguiam implementar algumas práticas, conforme foram capacitados pela Embrapa, devido à ausência de estrutura nas colocações.
“Já existem dois armazéns comunitários utilizados para estocar a produção, mas é importante que cada família tenha seu armazém individual, construído na colocação, para realizar de forma adequada a secagem da castanha coletada, um dos principais aspectos que influenciam a qualidade do produto. Cumprir as recomendações da pesquisa nessa etapa ajuda a evitar a contaminação por fungos, decorrente da alta umidade da região”, enfatiza a pesquisadora.
Dos 40 armazéns familiares previstos, 23 já foram entregues. Construída com orientação de profissionais da Embrapa, a estrutura em madeira tem tela na parte superior das paredes para facilitar a circulação de ar e facilitar a secagem das castanhas e com capacidade para estocar 540 sacas do produto.
Para dar suporte à logística de transporte da produção, o projeto prevê a compra de cinco carroças para retirada das castanhas da floresta (duas já entregues) e viabilizou a compra de uma caminhonete com carroceria, entregue à comunidade no final de 2019. Contar com meio de transporte próprio evita a ação de atravessadores na comunidade, permite a venda direta da produção para agroindústrias e possibilita a busca de novos mercados.
Castanhal e Bem Diverso
Financiado com recursos do Fundo Amazônia, o Projeto Castanhal foi aprovado em edital público lançado no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica – Ecoforte, iniciativa que apoia associações de base extrativista vinculadas a unidades de conservação federais, gerido pela Fundação Banco do Brasil. A execução das atividades previstas no Plano de Trabalho é de responsabilidade da Associação dos Pequenos Produtores Rurais e Extrativistas Wilson Pinheiro, que representa cerca de 50 famílias da comunidade composta basicamente por extrativistas e pequenos produtores rurais.
O Projeto Bem Diverso, por sua vez, desenvolve ações para a conservação da biodiversidade e manejo sustentável dos recursos naturais em áreas florestais e sistemas agroflorestais em Territórios da Cidadania localizados nos biomas Amazônia, Cerrado e Caatinga. Fruto da parceria entre a Embrapa e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e executado com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF), o projeto busca assegurar renda e qualidade de vida a populações de comunidades tradicionais e entre agricultores familiares.
Fonte: Embrapa