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Entrevista: “Estamos trabalhando incansavelmente para que a Lei Kandir seja mantida”

O agronegócio
brasileiro passa por um momento de apreensão. Desde o início do ano, o
Congresso Nacional discute a suspensão da Lei Kandir (Lei Complementar
87/1996), que isenta de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) a exportação de produtos primários. Os reflexos de um eventual fim da
lei teriam resultados “catastróficos” para os produtores rurais, para o
agronegócio nacional e para o Brasil como um todo, conforme Renato Conchon,
coordenador econômico da Superintendência Técnica (SUT) da Confederação da
Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Na tentativa
de manutenção da Lei Kandir, a CNA e as Federações da Agricultura, inclusive a
FAEP, estão fazendo um esforço de conscientização dos parlamentares. O trabalho
passa pela apresentação de estudos que comprovam a importância da lei para a
locomotiva do agronegócio, que puxa a economia do país nos últimos anos. “É
preciso uma ação coordenada para a manutenção da competitividade do Brasil”,
destaca Conchon.

Confira a
entrevista completa como o coordenador econômico da CNA, que aponta os
prováveis reflexos negativos da suspensão da Lei Kandir e o trabalho de
convencimento realizado pelas entidades da agropecuária brasileira para a
manutenção da mesma.

BI: De que maneira a Lei Kandir contribuiu
para que o agronegócio brasileiro avançasse em nível internacional e chegasse
ao patamar em que se encontra hoje?

RC: A Lei
Kandir faz parte de um arcabouço legal que permitiu a estabilidade econômica
brasileira. Em 1994, o Plano Real foi instituído, e para que se sustentasse era
necessário criar superávits da balança comercial brasileira. Esse superávit só
viria se o Brasil exportasse mais. Por isso, em 1996 a Lei Kandir foi
promulgada desonerando os tributos sobre as exportações de produtos básicos ou
semielaborados. A partir daí houve um aumento das exportações brasileiras.
Importante destacar que a desoneração de tributos sobre exportações é o padrão
no comércio internacional, ou seja, nenhum país se insere nos mercados globais
“exportando tributos”.

É possível fazer uma relação com a Lei
Kandir e o desenvolvimento do setor agropecuário?

Com certeza!
A Lei Kandir permitiu que os produtos agropecuários brasileiros se inserissem
no mercado internacional de maneira mais competitiva. Na sequência, o setor,
dada a sua natural aptidão, alavancou a produção e suas exportações. A Lei
Kandir, após a estabilidade trazida pelo Plano Real, sem sombra de dúvidas, foi
a alavanca que o setor precisava para se tornar um dos setores mais dinâmicos
da economia nacional, e um dos principais fornecedores de alimentos para o
mundo.

Na sua avaliação, o setor agropecuário con-
seguiria se manter competitivo com o fim da Lei Kandir?

Não, sem a
Lei Kandir o Brasil irá retroceder no mercado internacional pelo menos 25 anos.
O Brasil sofrerá impactos macroeconômicos significativos, com a redução das
exportações e do superávit na balança comercial, e no câmbio. O setor
agropecuário, por sua vez, terá uma consecutiva redução do faturamento. Os
produtores sofrerão uma redução nas receitas, uma vez que o aumento tributário
será repassado diretamente a eles, pois, para as commodities, somos tomadores
de preços.

Que reflexos mais imediatos a extinção da
lei causaria?

A CNA
elaborou material técnico e distribuiu aos parlamentares e ao Governo Federal,
com os impactos que uma possível revogação da Lei Kandir traria para a economia
brasileira e para os produtores rurais. No estudo, foi apresentado que a
competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional teria efeito
na redução das margens dos exportadores e, em alguns casos, inviabilizando as
exportações. Para produtos que não são commodities, ou seja, havendo uma
possibilidade de os exportadores repassarem os aumentos dos custos tributários
aos compradores internacionais, para três produtos analisados (celulose, carne
suína e melões frescos), nossos principais competidores globais passariam a ter
preços menores que o nosso. A possibilidade de perda de mercados está estimada
em 6,2 bilhões de dólares, o equivalente a aproximadamente 6% das nossas
exportações em 2018.

Outro impacto
estimado seria a redução dos preços das commodities pagos aos produtores
rurais. Segundo o estudo, o preço da saca de soja pago aos produtores da região
de Cascavel poderia cair até 23% no prazo de 12 meses. Seria uma catástrofe aos
produtores em todo o Brasil. Essa redução dos preços pagos aos produtores teria
outro impacto na sequência, que seria a redução do faturamento do setor. O
Valor Bruto da Produção (VBP) poderá cair até 8,1%, o que significa menos renda
circulando no Brasil.

Há algum setor que seria mais afetado?

Todos os
exportadores seriam prejudicados com a revogação da Lei Kandir, mas os
produtores de commodities (soja, milho, café) seriam, sem sombra de dúvidas, os
mais prejudicados.

Para o produtor rural, haveria alguma consequência
no que diz respeito à renda?

Sim, o VBP
poderá cair 8,1%. Em termos reais, significa que aproximadamente R$ 47,9
bilhões deixarão de entrar na renda dos produtores e nos caixas do governo.
Isso significa menos renda circulando nos municípios. O comércio local das
principais cidades agrícolas será afetado negativamente em todo o Brasil. No
Paraná, onde a agropecuária possui papel relevante na economia regional seria
um grande retrocesso se essa medida prosperasse.

Que efeitos isso implicaria à balança
comercial do Brasil?

Uma possível
revogação da Lei Kandir prejudicará muito a economia nacional com a redução das
exportações em até 6%, conforme o estudo da CNA. No momento que estamos
discutindo acordos comerciais tão importantes para a economia brasileira, como
o recente acordo Mercosul/União Europeia, no qual haverá transação de
mercadorias sem incidência tributos entre os países, justamente neste momento
estamos querendo tributar nossas exportações. Será uma catástrofe causada pela
irresponsabilidade! Nossos produtos agropecuários serão menos competitivos aqui
dentro que os exportados pela União Europeia, pois além de não tributar as
exportações, fornece subsídios agrícolas para os produtores europeus.

De que forma a CNA e as Federações têm
atuado no sentido de apontar ao governo federal o real impacto de uma eventual
extinção da Lei Kandir para o setor?

A CNA está
atuando junto ao Congresso Nacional e ao governo federal, para que
parlamentares que estão propondo a revogação da lei não sigam com essa proposta
incoerente. Já conversamos com o autor da Proposta de Emenda Constitucional
(PEC) e com o relator da PEC no Senado. Além dessas reuniões, a CNA vem atuando
junto a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), para sensibilizar os demais
parlamentares em não permitirem que a proposta siga adiante. Além de tratar com
o Congresso, a CNA se reuniu com o Ministro da Economia, Paulo Guedes, e com o
secretário de Assuntos Internacionais, Marcos Troyjo, para apresentar as
preocupações do setor quanto ao tema. As Federações estão articulando com os
parlamentares do seu Estado. Estas ações coordenadas visam sensibilizar o
máximo de parlamentares no sentido de manter a Lei Kandir como está atualmente,
para o bem do agronegócio, para o bem do Brasil.

Que outro tipo de atuação política tem sido
feita pela CNA junto ao governo no sentido de garantir a manutenção da Lei?

A CNA tem
participado ativamente nas Comissões da Câmara dos Deputados e no Senado
Federal, por meio de audiências públicas, noticiários em jornais e rádios em
todo Brasil. Nas reuniões, os representantes da CNA apresentam nossa posição
aos sindicatos e produtores rurais, para que todos tenham conhecimento da
posição e possamos fazer uma ação coordenada para a manutenção da competividade
do Brasil.

Que tipo de retorno o governo federal tem
dado?

Nas conversas
com os representantes do governo federal ficou claro que a medida vai em
sentido contrário ao que a equipe econômica defende, que seria a liberalização
e a internacionalização da economia. O ministro Paulo Guedes e o secretário
Marcos Troyjo afirmaram que seria um prejuízo muito grande ao país caso a
medida prospere. Lembraram ainda que as propostas que estão sendo discutidas
neste momento são de iniciativa do Congresso Nacional e não do Poder Executivo.

Há perspectivas de que a Lei Kandir seja
mantida?

Estamos
trabalhando incansavelmente para que a lei seja mantida. Não podemos retroceder
nas medidas econômicas que fizeram com o que Brasil fosse competitivo no
mercado global. O agronegócio brasileiro depende da Lei Kandir para continuar
sendo protagonista no mundo, o Brasil depende da Lei Kandir para manter sua
estabilidade macroeconômica. Não vamos retroceder na defesa dos interesses da
nação.

O que é a Lei Kandir?

Desde 1996, a Lei Complementar 87/1996 acabou por ser conhecida pelo nome de seu autor, o então deputado federal e economista Antônio Kandir (que chegou a ser ministro do Planejamento no governo de Fernando Henrique Cardoso). A lei prevê a isenção do pagamento de ICMS sobre exportações de produtos primários e semielaborados ou serviços. O montante que os Estados deixariam que arrecadar com a cobrança deste imposto seria coberto pelo governo federal, por meio de repasses anuais.

Leia mais matérias sobre o agronegócio no Boletim Informativo.

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Fonte: Sistema FAEP



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