O constante riscado dos caminhões puxando carretas estufadas com soja ou enormes cilindros prateados carregados de leite não passa despercebido nas paisagens dos Campos Gerais. A região é o epicentro de um entroncamento rodoferroviário para o escoamento da oleaginosa do interior do Paraná e de outros estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás até o Porto de Paranaguá. E, ao mesmo tempo, abriga uma das principais bacias leiteiras do país. Anualmente, cerca de 6,5 milhões de toneladas de soja em grão e mais de 500 milhões de litros de bebida circulam pelas estradas da região.
Ao longo das últimas décadas, a infraestrutura dos trechos da BR-376 e da PR-151 que cortam os Campos Gerais colaborou diretamente para determinar o desenvolvimento e crescimento da produção destas duas importantes atividades agropecuárias do Paraná. Inclusive, o enorme volume de cargas que transita por estas estradas contribuiu para batizá-las, mesmo que extraoficialmente, de Rodovia da Soja e Rodovia do Leite, respectivamente. Mas as cadeias do leite e da soja não são as únicas beneficiadas pela infraestrutura rodoviária da região. Apesar dos trechos da BR-376 e da PR-151 que cortam os Campos Gerais necessitarem de melhorias em função dos gargalos, a malha, em grande parte duplicada, contribuiu para atrair empresas para suas margens.
– Como Curitiba já está saturada, muitas empresas estão indo para os Campos Gerais, onde conseguem áreas maiores e mão de obra. Como não é tão longe do porto [de Paranaguá] e a pista é toda duplicada, a região atrai indústrias, não só do agronegócio – relata João Arthur Mohr, membro do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep). Um exemplo é a fábrica da Ambev, em construção em Ponto Grossa.
- A rede rodoviária dos Campos Gerais melhorou bastante por causa das duplicações. A região tem um dos melhores escoamentos do Paraná, o que beneficia muito o agronegócio – complementa Mohr.
Dos 450 quilômetros de extensão da Rodovia da Soja, 229 são duplicados, incluindo o corredor de exportação até o Porto de Paranaguá, e outros 51 km possuem terceira faixa. No trecho da Rodovia do Leite entre Sengés e Palmeira, 73 quilômetros estão duplicados e outros 32 km possuem a terceira faixa, do total de 154 quilômetros.
Diversificação está no DNA da Rodovia do Leite
Não é apenas o leite e seus derivados que colocam a PR-151 na posição de uma das principais artérias logísticas dos Campos Gerais, do Paraná e, sem excesso de zelo, do Brasil. A estrada, que tem suas extremidades em São Mateus do Sul, na divisa com Santa Catarina, e Ribeirão Claro, na divisa com São Paulo, é via de passagem para boa parte das riquezas que são geradas nos campos dos estado.
Por estar no centro da produção agrícola estadual, a PR-151 também serve de passagem para os grãos. O trecho compõe o corredor de exportação de Goiás, um dos principias produtores nacionais de soja, até o Porto de Paranaguá. Além disso, a Rodovia do Leite se relaciona direta ou indiretamente com outras importantes rodovias, como as BRs 153 e 343 e as PRs 090 e 340, o que permite uma diversidade logística.
“A qualquer ‘dor de barriga’ em Santos, os exportadores de vários cantos do país precisam usar a PR-151 para acessar Paranaguá”, destaca José Alberto Moita, presidente da concessionária CCR Rodonorte. “Também é a ligação de São Paulo com os países do Mercosul. Descem pela 151 até Ponta Grossa e depois para o Paraguai”, complementa o executivo.
A rodovia também possui ligação com outros tipos de negócios. “Tem um pouco do turismo em função das colonizações alemã e holandesa”, afirma Moita. Na Colônia Witmarsum, em Palmeira, um dos municípios cortados pela Rodovia do Leite, o roteiro turístico inclui confeitarias típicas, restaurantes, lojas, pousadas, museu, atividades radicais e ecoturismo.
Nos finais de semana, o produtor Ewald Wiens, descendente de alemães, coloca o trator – que nos dias de semana ajuda nas lavouras de soja, feijão e canola – para puxar uma carreta – fabricada por ele mesmo – lotada de turistas que querem conhecer as belezas naturais da região. “O fluxo de turistas sempre foi grande, principalmente para conhecer a gastronomia alemã. Então resolvi inventar o passeio de trator e deu certo. Todo o final de semana enche de turistas. E acaba gerando uma renda extra”, diz Wiens.
Eficiência logística estimula investimentos no leite
Todas as manhãs, quando o caminhão de leite encosta no portão da fazenda em Castro, o produtor Tilberto Henrique Husch tem a certeza que os 5,5 mil litros produzidos diariamente irão percorrer os 18 quilômetros até a indústria com segurança e rapidez. “Temos certificados que garantem a qualidade do nosso leite. E o transporte é fundamental para a manutenção desse status”, diz.
A estabilidade do setor e a logística organizada da porteira para fora foram os motivos que fizeram Husch investir cerca de R$ 900 mil na propriedade nos últimos anos a fim de alavancar a produção dos 300 animais, sendo 170 em lactação. “Construímos novos barracões e reestruturamos a sala de ordenha. O reflexo está no aumento da produção de leite por animal [média de 35 litros por cabeça]”, comemora o produtor, que planeja ampliar a sala de ordenha de 12 para 20 posições.
Transporte como elo da cadeia produtiva do leite na PR-151
Às margens da PR-151, entre Sengés e Palmeira, a pecuária leiteira quebra recordes de produtividade por animal e põe na estrada milhões de litros de leite por ano. Em uma atividade onde o transporte é uma das engrenagens da produção, em função de o produto ser perecível, a rodovia que interliga as fazendas até as indústrias lácteas assume papel de destaque na cadeia do alimento.
“O leite exige deslocamento rápido, ou seja, a logística é extremamente importante. As vias principais que temos dão condições que não ocorra quebra de caminhão e o transporte do leite seja realizado com eficiência”, destaca Henrique Costales Junqueira, gerente da área de negócios do leite da cooperativa Castrolanda, em Castro, nos Campos Gerais, e co-gestor do Pool Leite. “A rodovia também é usada para levar os derivados [do leite] para outras regiões”, complementa José Alberto Moita, presidente da concessionária CCR Rodonorte, que administra trechos da PR-151 e também da BR-376.
“O transporte é o maior custo logístico na cadeira do leite. É preciso otimizar a coleta para reduzir o frete”, aponta Junqueira. Para minimizar os gargalos, alguns trechos da PR-151 devem ser duplicados nos próximos anos. Até o final de 2018, os 40 quilômetros entre Jaguariaíva e Piraí do Sul, que hoje contam com 32 quilômetros de pista com terceira faixa, ganharão pista dupla. Os 30 quilômetros que ligam Piraí do Sul a Castro são duplicados.
Além disso, obras de alargamento da pista e construção de viadutos no entroncamento de Jaguariaíva estão 70% concluídas, com previsão de termino ainda esse ano para reorganizar o fluxo. “A malha viária do Paraná gera um apoio muito forte para o agronegócio nacional. Para a economia de uma forma geral. Precisamos melhorar alguns pontos”, diz Moita.
Obras prometem mais agilidade no escoamento da soja da BR-376
O trecho da rodovia BR-376 que corta os Campos Gerais tem papel fundamental no escoamento da produção paranaense. Porém, apesar de milhões de toneladas de soja e litros de leite circularem pela região, gargalos geram transtorno operacional, atraso na entrega, aumento de custo e, até mesmo, acidentes.
- Qualquer coisa que aumente a velocidade de transporte e gere menos quebra de caminhão é uma melhora significativa – destaca Henrique Costales Junqueira, co-gestor do Pool Leite.
Para o membro do Conselho de Infraestrutura da Fiep, João Arthur Mohr, o principal gargalo na Rodovia da Soja é a transposição por Ponta Grossa.
- Dependendo do horário, é preciso duas horas para percorrer 33 quilômetros – diz. José Alberto Moita, presidente da Rodonorte, conta que obstáculos como trânsito, congestionamentos e semáforos reduzem a velociadade a 45 km/hora no trecho.
A solução passa pela construção de um contorno de 45 km que ligaria o Sul ao Norte do município por uma via alternativa. Segundo a Rodonorte, o percurso maior seria compensado com um ganho na velocidade média nominal, para 80 km/hora.
- Isso tiraria o tráfego pesado de dentro da cidade e economizaria tempo e combustível – complementa Mohr.
O projeto está nas mãos da Secretaria Estadual de Infraestrutura e Logística (SIL) e do Ministério dos Transportes. A obra, estimada em R$ 500 milhões, não faz parte do contrato com a CCR Rodonorte.
550 acidentes
Envolvendo 1,6 mil pessoas foram registrados no ano passado na BR-376. Apenas no trecho da Av. Souza Naves, que corta Ponta Grossa, são em média 22 mortes ao ano, metade por atropelamento.
430 milhões
De litros do alimento foram produzidos no ano passado pelos 1.441 produtores de oito cooperativas (Castrolanda, Frísia, Capal, Coac, Bom Jesus, Coamic, Agrária e Witmarsum) que integram o Pool Leite. Grupo prevê crescimento de 10% na produção neste ano. Entre outros objetivos, a entidade foi criada para coordenar a logística de coleta do leite nas propriedades.
Fluxo pesado
Obras de duplicação da Rodovia da Soja entre Ponta Grossa e Tibagi. Trecho entre os quilômetros 456 e 467 deve ser concluído até o final de 2015. Fluxo de caminhões na região deve passar de 6 milhões/ano atualmente para 8 milhões/ano em 2012, de acordo com projeções
da CCR Rodonorte, concessionária que administra o trecho.
Refresco no tráfego
O tráfego de veículos pesados terá um alento nos próximos anos na PR-151. Nos 73 quilômetros de pista dupla entre Sengés e Palmeira, os caminhões de cargas, principalmente agropecuárias, cumprem a viagem sem engarrafamentos. Mais 40 quilômetros, do total de 154, serão duplicados até 2018.
Histórico
Considerado o maior entroncamento rodoferroviário da Região Sul do país, Ponta Grossa marca o cruzamento das estradas PR-151 e BR-376, além de ser o ponto de partida de estradas como BR-373, PR-513 e PR-438.
Rodovia da Soja
Com 50 anos, a BR-376 foi construída em caráter de urgência como uma medida estratégica para ligar o Norte do estado e Curitiba. Temendo a possibilidade de os municípios de Londrina, Maringá e Jacarezinho deixarem de fazer parte do Paraná para integrarem São Paulo, o governador da época, Ney Braga, priorizou a obra. Antes, com acesso difícil à capital do estado e ao litoral, a região encaminhava sua produção ao Porto de Santos, para onde a viagem era menos difícil.
Com o Paraná passando por dificuldades financeiras, o recurso para a construção da rodovia veio dos Estados Unidos, que na época estavam fomentando obras com o programa Aliança para o Progresso. Os trabalhos duraram quatro anos, até que a estrada, batizada na época de Rodovia do Café, fosse inaugurada, no dia 25 de julho de 1965.
Rodovia do Leite
A PR-151 começa na divisa com São Paulo e corta toda a região leste do Paraná até a divisa com Santa Catarina. Ao longo de seus 468 quilômetros de extensão, a rodovia recebe diversos nomes. O trecho conhecido como Rodovia do Leite está entre Sengés e Palmeira. De Sengés até Ponta Grossa, a estrada tem como nome oficial Senador Flávio Carvalho Guimarães, conforme lei estadual de 1988. O trecho entre Ponta Grossa e Palmeira, o nome é Deputado João Chede, segundo lei estadual de 1979.
Fonte: Gazeta do Povo