A transição do período chuvoso para o período seco, vivenciada neste final de agosto no semiárido brasileiro, reforça a importância do planejamento para alimentação dos rebanhos. Como na época seca os pastos perdem parte dos nutrientes, os produtores rurais que não se prepararam para fazer reserva alimentar podem recorrer a outras fontes de forragem, que tendem a ficar mais caras. Além de otimizar os custos de produção, o planejamento alimentar pode, ainda, reduzir o impacto da atividade pecuária sobre as pastagens, contribuindo para a sustentabilidade da criação de caprinos, ovinos e bovinos.
“Geralmente, muitos produtores só começam a se preocupar neste período seco, uma época em que não dá mais para fazer silagem, para plantar ou colher. Aí ficam em dependência muito grande da compra de forragem de outras regiões que, nesta época, têm preço mais elevado”, alerta a zootecnista Ana Clara Cavalcante, pesquisadora da área de Forragicultura e Pastagens da Embrapa Caprinos e Ovinos (Sobral-CE).
A recomendação, então, é que produtores tenham atenção ao planejamento alimentar ao longo de todo o ano, já iniciando no período chuvoso.
“Antes de começar este período seco, no final do ano, você já deve se preparar para o ano seguinte. Se o produtor se prepara com antecedência, vai economizar na gestão de sua propriedade”, frisa a pesquisadora.
Uma das alternativas para este planejamento são as ferramentas de orçamento forrageiro disponibilizadas pela Embrapa, como o aplicativo para celulares ou tablets, desenvolvido em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), pelo projeto Forrageiras para o Semiárido. Ele é útil para ajudar a contabilizar a quantidade de forragem disponível, a estimativa de consumo de seu rebanho e, calcular, mês a mês, se há sobra ou déficit de forragem nas propriedades.
Com uso do aplicativo, é possível caracterizar as fontes de alimentação disponíveis na propriedade rural e obter diagnósticos para saber se esses recursos forrageiros serão suficientes para os animais ao longo do ano.
“A partir disso, é possível partir para alternativas como compor palmal, banco de proteína, melhorar a capineira, usar outras fontes de forragem, fazer silagem, ter feno ou reduzir tamanho do rebanho. Importante ter um planejamento prévio, porque quando a época seca chega, pouca coisa pode ser feita”, destaca Ana Clara.
O aplicativo também possibilita que o usuário faça simulações sobre as condições de reserva alimentar para períodos futuros. Ao disponibilizar fotos de plantas forrageiras na época chuvosa, é possível comparar com a situação da propriedade rural e, ao inserir dados do rebanho e características da produção, se chegar a diagnósticos que orientem as tomadas de decisão.
“O importante é que ele seja usado como ferramenta de planejamento para que, quando comece o período seco, o produtor já tenha reserva de alimentos preparada”, reforça a pesquisadora.
De acordo com ela, até mesmo decisões como a redução do rebanho em períodos críticos de seca pode ter perdas minimizadas, caso haja esse planejamento.
“Com um planejamento prévio, se ele já sabe que não vai ter forragem suficiente no período seco para alimentar todo o rebanho, ele pode organizar antes um confinamento e vender animais para o mercado em um período em que esse remunere melhor o produto”, orienta ela.
A expectativa é de que, em 2020, o aplicativo ganhe uma nova funcionalidade: um simulador que sugere opções de forragem mais adequadas às condições locais, auxiliando no planejamento e gestão forrageira da propriedade de forma mais personalizada.
Impactos ambientais
O planejamento para uso dos recursos forrageiros também pode contribuir para um melhor manejo de pastagens e minimização da degradação de solos. A ferramenta permite que o usuário identifique, no comparativo com fotos que estão no aplicativo Orçamento Forrageiro, a condição de oferta de forragem (alta, média ou baixa) das pastagens de sua propriedade.
Caso predominem as áreas de alta ou média oferta, ele terá menos necessidade de adquirir forragem fora do pasto nativo. Se verificar a existência, porém, de áreas de baixa oferta, é possível prever a necessidade de intervenções para recuperar a fertilidade do solo e de evitar o problema do superpastejo (quando a quantidade de animais que se alimentam fica acima da capacidade suportada na área de pastagem)
“Não havendo superpastejo, a tendência é que aquela vegetação natural se recupere: você passa a ter um aumento das espécies forrageiras e, com isso, também aumenta a capacidade de suporte das áreas de pasto nativo. Tudo isso contribui para melhorar a condição de produção pecuária da propriedade”, destaca Ana Clara Cavalcante.
Ações emergenciais
Caso o produtor rural não tenha adotado um planejamento dos recursos forrageiros ao longo do ano, é possível adotar algumas ações emergenciais em caso de déficit no período seco no semiárido brasileiro. Entre elas, o corte do mandacaru ou outras plantas que permaneçam verdes nesta época. Também pode ser feito o uso do palmal ou de capineira, se o produtor contar com estes recursos.
Uma outra alternativa seria o descarte orientado de animais, o que deve ser feito ainda no início do período seco, quando a condição de escore corporal dos animais ainda é boa e não costuma haver, ainda, muita oferta no mercado. Se a compra de insumos para alimentação for necessária, é recomendável, ainda, que essa aquisição seja de fontes próximas à propriedade rural, para não onerar ainda mais os custos de produção.
A pesquisadora Ana Clara Cavalcante alerta, porém, que não é recomendável tomar essas decisões de gestão da propriedade rural somente quando o período seco já começa.
“Adotar essas ações emergenciais quando a seca se instala, via de regra, não é a maneira mais eficiente, produtiva e lucrativa. Elas vão salvar os animais, mas não vão colocar o produtor em posição de destaque ou competitividade”.
Fonte: Embrapa