De corpo intenso, aroma marcante e acidez cítrica agradável, o Café do Pinhal, produzido em oito cidades do interior paulista, é um dos 36 produtos típicos brasileiros protegidos por um acordo comercial entre os países do Mercosul e a União Europeia.
A medida, que ainda precisa de aprovação de todos os países, deve agregar ainda mais valor ao produto, incrementar a renda dos produtores, aumentar o turismo e viabilizar novas rotas de exportações devido a possibilidade de redução de tarifas entre os blocos.
O pacto também deve aumentar as exigências no ciclo entre a produção e a chegada à mesa do consumidor, seja ele do mercado interno ou europeu, segundo disseram ao G1 os produtores e a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado.
A história do café na região teve início em 1850 e se desenvolveu com a expansão das ferrovias até o Porto de Santos (SP).
Proteção contra pirataria
Mas o que significa o Café do Pinhal ser protegido pelo acordo Mercosul-União Europeia ? Quer dizer que o produto típico das cidades de Aguaí (SP ), Águas da Prata (SP), Espírito Santo do Pinhal (SP), Estiva Gerbi (SP), Itapira (SP), Mogi Guaçu (SP), Santo Antônio do Jardim (SP) e São João da Boa Vista (SP) não pode ser copiado em outros países, uma proteção contra a pirataria. Também serão proibidos os termos “tipo”, “estilo” e “imitação”.
O Café do Pinhal teve sua importância oficialmente reconhecida em 2016 quando ganhou do governo federal o certificado de Indicação Geográfica para o café verde e café torrado e moído.
Esse certificado emitido Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) foi fundamental para a bebida ser incluída no acordo firmado recentemente. O café do Pinhal segue regras rígidas de plantio, colheita e armazenamento, tudo para manter o rótulo de bebida especial.
Para se diferenciar das bebidas não especiais, o Café do Pinhal precisa ter pontuação mínima de 75 pontos, segundo critério da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA) que vai de zero a 100. Já para o tipo cereja descascado e despolpado – separação da polpa do grão- , a nota mínima exigida é 80 pontos.
Por que Especial?
O cafeicultor Henrique Antônio Leite Gallucci, que também é presidente da Coopinhal, é descendente de uma família que planta café desde 1837 em Espírito Santo do Pinhal.
Cabeça do processo para a Indicação Geográfica (IG), ele explica que a bebida de alta qualidade ganhou destaque nacional e internacional pelo fato das fazendas estarem em uma “mancha” de terras férteis para o cultivo. Outra vantagem é ter plantações em região de montanha, que se beneficiam do clima na época da colheita.
“O café de montanha tem outro ciclo. São os cafés que retém mais açúcares, são mais doces, mais especiais. O clima ajuda a maturar adequadamente o café. Uma temperatura de 15ºC a 16ºC faz o café dormir melhor na época da colheita para a suavidade que ele gosta”, aponta o cafeicultor.
A colheita do café vai de maio a primeira quinzena de outubro na região, que tem plantações acima dos 950 metros de altitude.
O resultado deste produto de altitude é uma bebida mais doce, que pode ser bebida pura, mesmo quando expresso (mais concentrado).
Os negócios vão subir?
E o acordo Mercosul-União Europeia pode influenciar positivamente nos negócios dos cafeicultores das oito cidades do Café do Pinhal. Cada safra rende aproximadamente 400 mil sacas nestes municípios, quase tudo é exportado.
Hoje, os produtores já conseguem, segundo a Cooperativa dos Cafeicultores da Região de Pinhal (Coopinhal), agregar valor nas exportações para países como a Rússia e Coreia do Sul, que estão fora do acordo recém lançado.
“Com a logomarca do Café do Pinhal você consegue em cidades do leste da Rússia, em Seul (Coreia do Sul) de R$ 20 a R$ 30 a mais por saca, porque significa que tem procedência e qualidade”, explica Leite Gallucci.
Ainda segundo ele, o Conselho do Café da Mogiana de Pinhal (Coocampi) tem uma série de normativas e de fiscalização do café produzido nas oito cidades.
O secretário estadual de Agricultura e Abastecimento, Gustavo Junqueira, comemora o acordo, que vai interligar agricultores paulistas de produtos de alto valor agregado com 500 milhões de consumidores.
Mas, Junqueira lembra que ao chegar ao mercado europeu, os agricultores dos 36 produtos protegidos no país precisam se atentar ao nível de exigência dos consumidores de lá. Vai ser necessário aumentar ainda mais o nível de qualidade em todo o ciclo.
“Não é venda de volume, é venda de qualidade. Eles são muito exigentes, mas não podemos esquecer que os nossos consumidores também estão cada vez mais exigentes”, alerta, já que o Café do Pinhal também é comercializado no Brasil.
O diretor de Comércio Exterior da regional Campinas do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo, Anselmo Riso, disse acreditar que as exportações do Café do Pinhal têm grandes chances de aumentar com o pacto. Segundo ele, alguns já estão se mobilizando para se enquadrar nos padrões europeus.
“O Brasil tem a chance de produzir os melhores café gourmet do mundo. E já está fazendo”, disse.
Mas, assim como o secretário de Agricultura, o especialista em exportações destaca a necessidade de padronização do produto para atingir outros mercados.
“A mudança também tem que ter o produtor nacional. Ele tem que sair da zona de conforto”, completa.
Sustentáveis
A Secretaria de Agricultura tem incentivado, segundo o secretário Junqueira, os agricultores a produzirem com métodos de sustentabilidade.
“São Paulo sempre se destaca na política de produção de proteção eficaz do meio ambiente”, afirma o secretário estadual.
Café solúvel e verde
Para o consultor Carlos Brando, que é fundador do Museu do Café, em Santos (SP), e da Associação de Cafés de Qualidade da África (AFCA), o acordo birregional vai beneficiar o café nacional, principalmente o solúvel.
O motivo, segundo ele, é a queda de sobretaxas pagas pelo produto nacional ao entrar no mercado europeu.
Já em relação ao Café do Pinhal, o especialista aponta que o principal benefício será para a exportação do produto industrializado.
“Café torrado e café torrado e moído, porque estes produtos pagam tarifas ao entrar na União Europeia e passariam a ser isentos”, aponta o especialista.
Ainda, segundo Brando, no caso do café solúvel, a isenção pode ocorrer entre quatro e cinco anos. Mas ele alerta que o acordo seria uma oportunidade para os agricultores do Café do Pinhal explorarem este nicho.
“Eu chamo de nicho porque é um mercado pequeno e o acordo abre caminho para crescer, porque exportar café industrializado não é só ter o produto de qualidade e não existirem barreiras alfandegárias. Mas, é também uma questão de marketing e colocação no mercado, marcas e logística, que são coisas que tem um custo, um tempo e se tem que enfrentar a concorrência de marcas estabelecidas que a gente conhece”, afirma Brando.
Para finalizar, o especialista disse acreditar que os produtores nacionais precisam não apenas da quebra de barreiras, mas a liberação da prática de importar cafés verdes de outras origens e associá-los ao do país, sem prejuízo para o café nacional.
“Noventa e cinco por cento do café consumido na Europa são ligas, são blends e não são cafés de uma única origem. Então, para entrar com força no mercado europeu, teríamos que ter a eliminação das barreiras alfandegárias como a possibilidade de vender cafés não só brasileiros, mas também a cafés ligados a outras origens”, aponta.
E o turismo?
Mas só os cafeicultores serão beneficiados com o acordo entre os países do Mercosul e a União Europeia. A expectativa é não. É esperado um aumento até do turismo nas oito cidades do Café do Pinhal, tudo para beber na fonte o produto de qualidade.
A empresária Adriana Jannes se mudou para Espírito Santo do Pinhal há treze anos para abrir uma cafeteria na cidade.
Segundo ela, já é perceptivo o aumento do turismo local por pessoas em busca do café de qualidade.
“Além disso, aqui, o ciclo do café é fechado, tem da muda ao exportador, passando pelo torrefador. ”, explica a empresária.
E para atrair mais consumidores, ela elaborou uma receita de torta que leva café na receita.
“As pessoas nos procuram para comer a Torta da Baronesa”, disse a empresária sobre o doce que se transformou um o carro-chefe do negócio dela.
Fonte: G1