De janeiro a agosto, o Brasil importou 4,6 milhões de toneladas, sendo 4,1 milhões da Argentina, segundo a Abitrigo.
Os moinhos de trigo do Brasil, um dos maiores compradores globais do cereal, estão se fiando em uma safra recorde na Argentina em 2018/19 para lidar no próximo ano com uma forte concorrência pelo produto do país vizinho, o que tem colaborado para sustentar os preços do cereal argentino.
Brasileiros esperam ainda que uma safra maior na Argentina, que este ano atendeu por cerca de 90 por cento das importações de trigo do Brasil, possa ajudar a limitar os efeitos de maiores custos pela alta do dólar contra o real, que baliza o preço do cereal nacional, além de elevar os valores para a importação, segundo especialistas e integrantes da indústria.
A expectativa do setor é de que grandes compradores globais, incluindo asiáticos, voltem-se mais em 2019 para a Argentina, um dos poucos produtores relevantes no mundo com chances de elevar a produção em 2018/19, após safra menores na União Europeia, Rússia, Austrália e Canadá, devido a problemas climáticos.
Mas a safra recorde esperada na Argentina, em torno de 20 milhões de toneladas pela indústria brasileira, limitaria problemas maiores para o Brasil, apesar de outros países já terem realizado muitas compras antecipadas no vizinho.
“Tudo isso influenciou, sim, o mercado. A expectativa há dois meses era de que a Argentina estaria com preço mais baixo na entrada da safra, no final de novembro. Mas os negócios para dezembro e janeiro estão mais altos do que se imaginava”, afirmou o presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), Marcelo Vosnika.
Para ele, as quebras de safras em vários países já estão precificadas na Argentina, onde o trigo para exportação (FOB) está fixado no momento a 230 dólares por tonelada, uma alta de 25 por cento ante o mesmo período do ano passado. Para embarque em janeiro, oscilam entre 222-226 dólares/tonelada, segundo a consultoria T&F Agroeconômica.
Contudo, Vosnika destacou que espera que a Argentina tenha trigo suficiente para atender o Brasil e outros clientes.
“Pelo volume que a Argentina vai colher, ainda não é uma pressão tão grande… Vai ter bastante oferta para atender outros mercados também…”, disse o dirigente da Abitrigo.
O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) estima uma safra argentina em 19,5 milhões de toneladas (ante 18 milhões na safra anterior), volume semelhante ao projetado na quarta-feira pela Bolsa de Cereais de Buenos Aires.
VENDAS ANTECIPADAS
Segundo ele, a Argentina já vendeu antecipadamente 3 milhões de tonelada da safra nova, sendo grande parte para outras origens que não o Brasil.
Para o presidente da Abitrigo, o país poderá ter de buscar na Argentina entre 6 milhões e 6,5 milhões de toneladas no ano que vem —outras 500 mil toneladas os brasileiros comprariam no Uruguai e principalmente no Paraguai, integrantes do Mercosul, onde as negociações ocorrem sem tarifas.
Conforme Vosnika, a preocupação maior é com o dólar, que além de elevar os custos para a importação também influencia no valor pago pelo produto brasileiro, cuja colheita já começou.
“A dúvida neste ano é o dólar, a variação do dólar está muito grande. Se acontece a eleição e o dólar volta para 3,70 reais, o trigo vai ter que ser vendido a 600 reais (por tonelada no Brasil), se não, vai a 900. A grande variável deste ano é o dólar”, explicou Vosnika, indicando que a alta de custos dependerá do câmbio.
Neste momento de incertezas diante da campanha eleitoral no Brasil, ele afirmou que os moinhos não estão alongados nas compras. “Em teoria, vão comprar da mão para boca até novembro e dezembro, qualquer candidato que ganhe, vai ter um ministro novo da Fazenda, o dólar vai seguir instável até fevereiro, março”, disse ele, lembrando que o Brasil ainda recebe a safra velha.
De janeiro a agosto, o Brasil importou 4,6 milhões de toneladas, sendo 4,1 milhões da Argentina, segundo a Abitrigo.
Para o comprador de um importante moinho do Brasil, que preferiu não ser identificado, é possível que a colheita argentina consiga atender bem o Brasil, mas isso ainda dependerá do desenvolvimento da safra —ainda faltam 60 dias para o início da colheita, que está sujeita a algum problema climático.
O consultor Luiz Pacheco, da T&F Agroeconômica, tem uma visão de que o Brasil enfrentará um oferta mais apertada, apesar do crescimento da safra.
“A Argentina já comprometeu de 40 a 50 por cento de sua disponibilidade da nova safra, então eles só têm metade do trigo para vender. Como a Argentina é o único país que produz trigo duro que deve ter aumento de produção… O Brasil disputaria a outra metade, e os preços devem subir”, afirmou Pacheco.
Ele lembrou que asiáticos estão de olho no trigo da Argentina em função da quebra de safra na Austrália.
Ele disse ainda não acreditar que o dólar caia, citando um nervosismo do mercado com a transição de poder no Brasil.
Fonte: Reuters