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EFEITO CHUVA

A desvalorização do real frente ao dólar que acarretou no aumento dos custos de produção, principalmente dos fertilizantes; a baixa cotação do trigo no mercado do Rio Grande do Sul e, especialmente, a influência do fenômeno climático El Niño que traz chuva acima da média. Esses três fatores pesaram bastante no momento de o agricultor gaúcho implantar a lavoura de inverno com uma cultura de alto risco como o trigo. As chuvas que não dão trégua há duas semanas, afetam diretamente o plantio e o desenvolvimento do cereal que já está na lavoura. De acordo com o último levantamento da Emater/RS-Ascar nesta quinta-feira (16/07), o longo período de alta umidade e baixa luminosidade tem deixado os produtores apreensivos, neste momento crítico para a principal cultura de inverno.

- A fase de perfilhamento e o desenvolvimento dos perfilhos viáveis dependem muito da disponibilidade de macronutrientes, principalmente de nitrogênio. Nesse sentido, as pesadas chuvas que ocorreram recentemente em importantes zonas produtoras causaram a lixiviação deste elemento ou mesmo a perda por erosão laminar – explicam os técnicos da Emater/RS-Ascar.

Devido ao excesso de umidade presente no solo, os triticultores ficam impedidos de executar a reposição dos adubos necessários às plantas, além de comprometer o controle de invasoras e doenças fúngicas.

Com esse cenário, o plantio do trigo evoluiu pouco durante o período, chegando a apenas 83% da área, contra os 80% registrados na semana passada, conforme o acompanhamento da Emater. O período ideal para o plantio, segundo o zoneamento agroclimático, se encerra nos próximos dias e já está concluído em alguns pontos do Estado.

Segundo levantamento realizado em 288 municípios, que abrangem 92,5% do total cultivado no Estado, a área de trigo nesta temporada deve diminuir 22,6% em relação a safra anterior, atingindo 913,5 mil hectares, frente a estimativa anterior que era de 20% de queda (945,5 mil hectares) na comparação com o plantio passado. A projeção de produtividade permanece em 2,4 mil quilos por hectare.

No início do mês, o engenheiro agrônomo da Emater Regional de Passo Fundo, Luiz Ataides Jacobsen, dá antecipou ao portal Agronovas que a safra de trigo poderia encolher ainda mais.

- Há um sentimento de que essa redução possa ser um pouco maior – destacou na época o agrônomo.

Cautela ao investir

Os investimentos em insumos também andam em marcha lenta nesta temporada. A mesma valorização da moeda norte-americana que foi bem-vinda na época de venda da soja, fez o preço dos insumos dispararem e encarecer a lavoura de inverno. Ressabiado com os prejuízos provocados pela chuvarada na safra anterior, o triticultor não está disposto a apostar alto e perder novamente com o trigo.

- Alguns agricultores estabeleceram a lavoura com menores investimentos em insumos, mas não se sabe esse número e o impacto na produção futura – analisa o engenheiro agrônomo da Emater.

Ameaça do céu

Assim como em 2014, quando o excesso de chuva causou perdas na produtividade e na qualidade do trigo, que na maior parte não alcançou PH 78 e virou ração, afetando em cheio a rentabilidade no campo, o triticultor do Rio Grande do Sul está preocupado com a possibilidade do El Niño voltar a fazer a safra virar prejuízo. A notícia dos Institutos de Meteorologia não é animadora: o fenômeno climático que representa chuva acima da média deve voltar a agir neste inverno. Tanto a Climatempo como a Somar Meteorologia são unânimes em prever um comportamento do tempo muito semelhante ao ano passado. O que já está se confirmando até o momento.

- Estamos com um El Niño formado e que deve se manter e influenciar as regiões produtoras de trigo neste inverno, principalmente o Rio Grande do Sul. Em anos de El Niño é normal termos chuva demais neste Estado e em Santa Catarina. Também temperatura mais alta do que o normal nos Estados da região Sul – antecipa o mestre em meteorologia, meteorologista da Climatempo, Alexandre Nascimento.

- Devemos ter neste inverno um clima muito parecido com o registrado em 2014. Isso porque as águas equatoriais do Oceano Pacifico irão se manter com temperaturas acima da média e isso irá favorecer a entrada das frentes frias durante esse período – acrescenta o agrometeorologista da Somar Meteorologia, Marco Antonio dos Santos.

- A expectativa é de mais chuva do que a normalidade, de forma geral. Podemos ter uma situação semelhante à do ano passado, em relação à quantidade de chuva – reforça o meteorologista da Climatempo.

Mas para o produtor não jogar a toalha antes do tempo, o agrometeorologista informa que há uma luz no fim do túnel: as águas equatoriais do Pacífico estão num processo de resfriamento e dependendo de quando a região central e leste do Oceano apresentar águas mais frias do que a média, poderá ocorrer um período mais seco. É preciso então rezar para que essa fase sem chuva ocorra durante a colheita para não provocar perdas pelo segundo ano consecutivo. Mas será importante ter muita fé, porque a tendência é outra.

- Se confirmar as previsões, o período da colheita será bem chuvoso, o que poderá levar a novas quebras de produtividade e qualidade – revela Marco Antonio. 

Mercado estável

Três aspectos são determinantes para a formação do preço do trigo nesta temporada: o mercado internacional, a produção nacional do cereal e o câmbio. No atual cenário, somente o dólar está jogando a favor do triticultor.

Os estoques mundiais andam em patamares elevados: para se ter uma ideia, há três anos – na safra 2012/13 o volume de trigo ao redor do mundo era de 176 milhões de toneladas e para a safra 2015/16 (junho de 2015 a maio de 2016) a projeção é de 202 milhões de toneladas.

- Não existe tendência de recuperação dos preços internacionais. Devemos manter os patamares próximos ao do ano passado – avalia o analista de mercado da Safras & Mercado, Elcio Bento.

Outra variável que afeta a cotação do trigo aqui no Brasil é a produção doméstica. Segundo estimativa da Consultoria Safras & Mercado, mesmo com uma área 6% menor nesta temporada, a colheita nacional do cereal alcançará 7,4 milhões de toneladas, contra os 6,3 milhões de toneladas obtidas no ano passado. O Paraná deve responder por 4 milhões de toneladas e o Rio Grande do Sul por 2,8 a 3 milhões de toneladas. Mas esse potencial produtivo precisa ser confirmado no campo, o que deixa esse fator ainda flexível para compor a cotação do cereal.

A disparada do dólar foi fundamental para equilibrar a cotação do cereal do ano passado pra cá: o mercado internacional do trigo desvalorizou 18,5% e a moeda norte-americana valorizou 38% no mesmo período.

- Esse fator pode sustentar novamente os preços no Brasil – ressalta Bento.

Mas o mercado do trigo não deve sofrer grandes alterações, de acordo com a projeção da Safras.

- No ano comercial a cotação deve ser superior ao último ano, devido ao câmbio, ficando numa média de R$ 30/saca – avalia Bento.



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