A Embrapa dispõe de dois novos ativos tecnológicos voltados ao mercado de defensivos agrícolas: uma formulação natural contra nematoides e outra para liberação controlada de produtos. As duas tecnologias, que estão em fases intermediárias de desenvolvimento, utilizam resíduos das cadeias produtivas de biocombustíveis e de celulose como matérias-primas. A Empresa busca, agora, parceiros para as próximas etapas do desenvolvimento, a serem feitas em conjunto com Embrapa Agroenergia e Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.
A primeira tecnologia aproveita o resíduo da extração de óleo de grãos para conseguir extratos capazes de controlar nematoides, especialmente os do gênero Meloidogyne, que ameaçam a produtividade das lavouras no Brasil e no mundo. Estimativas da Sociedade Brasileira de Nematologia apontam que o prejuízo causado por nematoides na agricultura chega a R$ 35 bilhões, quase metade disso só na cultura da soja.
A pesquiadora Vera Polez, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, explica que o controle de nematoides é difícil e exige a constante renovação dos produtos utilizados para esse fim, já que os organismos acabam desenvolvendo resistência. No Brasil, esse controle é feito principalmente com defensivos químicos, potencialmente causadores de danos ao meio ambiente e à saúde humana e animal.
Nematicida natural, menor impacto ambiental
Os primeiros testes, realizados em laboratório por Polez e pelo pesquisador Thales Lima Rocha, comprovaram que os extratos naturais obtidos pela Embrapa têm efeito nematicida e nematostático. Isso quer dizer que eles são capazes de controlar a população de nematoides ou de paralisá-los de forma a reduzir a infestação e evitar prejuízos à produção.
O pesquisador Clenilson Rodrigues, da Embrapa Agroenergia, explica que a primeira vantagem dos extratos obtidos em comparação aos produtos já disponíveis no mercado é o fato de ter origem vegetal e não petroquímica.
- Queremos colocar no campo um produto natural e que seja mais específico. Os nematicidas sintéticos normalmente têm amplo espectro e acabam afetando a microbiota de que as espécies vegetais necessitam para se desenvolver. Com isso, acaba-se eliminando outros organismos que poderiam auxiliar o desenvolvimento da lavoura, além de provocar contaminação de solo, lençol freático, etc – explica. Polez complementa que há uma tendência mundial de utilizar tecnologias verdes, que causam menor impacto ao meio ambiente.
- Existem muitas estratégias para isso e uma delas é usar produtos naturais, explorar a biodiversidade – pontua.
Além de trabalhar com o próprio extrato, outra possibilidade é fazer pequenas modificações na estrutura química do princípio ativo, para potencializar a atividade nematicida.
- Em busca dessa alternativa, processos de isolamento estão sendo desenvolvidos para se chegar ao princípio ativo, o qual será empregado como molécula precursora para inclusão de grupos funcionais que irão conferir maior eficiência e especificidade ao produto, além da estabilidade necessária para ser aplicado em campo – pontua Clenilson.
Nesse sentido, o grupo de trabalho já está em fase avançada de desenvolvimento dos processos envolvidos na separação dos compostos ativos.
Lignina para liberação controlada de produtos
A segunda tecnologia para o mercado de agroquímicos aproveita um resíduo muito abundante no Brasil: a lignina kraft, gerada na indústria de papel e celulose. Com esse material, os pesquisadores conseguiram microencapsular um composto para manejo integrado de pragas, de forma que ele passasse a ser liberado lentamente no campo.
A vantagem dessa tecnologia em relação às já disponíveis no mercado para liberação controlada de produtos é o uso de uma matéria-prima abundante, residual e, portanto, de baixo custo. O pesquisador Silvio Vaz Júnior, da Embrapa Agroenergia, destaca também que a equipe desenvolveu um processo simples, para facilitar a produção industrial.
- O que nós estamos fazendo é propor a lignina como matriz para liberação lenta de produtos no campo. É um resíduo que tem um valor baixo de mercado e possui boas propriedades para microencapsulamento e nanoencapsulamento, por exemplo, a facilidade de interação com moléculas semioquímicas – afirma Vaz.
Semioquímicos são substâncias produzidas por seres vivos e utilizadas por eles para comunicação, a exemplo dos feromônios. Nos ensaios com a tecnologia, a Embrapa utilizou uma substância dessa classe, o cis-jasmone. A pesquisadora Maria Carolina Blassioli Moraes, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, conta que, embora ainda não seja usado comercialmente, esse composto já é sabidamente capaz de atrair inimigos naturais dos insetos que prejudicam a lavoura, controlando a população sem utilizar produtos tóxicos.
Nos testes em laboratório, os pesquisadores mediram a quantidade de cis-jasmone liberada diariamente durante 30 dias e verificaram que o microencapsulamento com a lignina conseguiu manter a liberação do produto estável, como se esperava. Também foram realizados testes no campo, espalhando armadilhas com o cis-jasmone microencapsulado em uma lavoura de algodão. Nesse experimento, verificou-se que efetivamente os inimigos naturais desejados foram atraídos para a área. Além da Embrapa Agroenergia e Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, esse trabalho contou com a colaboração da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e com recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
De acordo com Moraes, a agricultura precisa de novas tecnologias para a liberação controlada de produtos voltadas ao manejo integrado de pragas. Atualmente, os materiais mais utilizados para essa finalidade são feitos de borracha e funcionam bem, mas têm limitações. A principal dificuldade é conseguir liberar diferentes moléculas nas mesmas proporções e com a mesma eficiência com que os seres vivos fazem naturalmente.
O mercado de semioquímicos está em expansão. Em âmbito mundial, estimativas apontam que o uso de feromônios tenha atingido valor de mercado superior a 300 milhões de dólares em 2013. No Brasil, não há dados disponíveis, mas o crescimento do número de empresas trabalhando com semioquímicos indica aumento do consumo pelos agricultores.
Fonte: Embrapa
Foto: Dulce Mazer