Talvez o principal trunfo de uma empresa que tem a inovação no DNA é a capacidade de encontrar alternativas em momentos de desafio. É o caso da Chip Inside, start-up criada na Incubadora Tecnológica de Santa Maria (ITSM) em 2010.
Após desenvolver um produto com poucos semelhantes no mundo, a queda nas vendas durante o ano passado exigiu mais inovações.
O novo modelo de negócio, que permite o aluguel do sistema, e o chamado CowMed, o plano de saúde da vaca, impulsionaram o crescimento da empresa. Após as primeiras vendas da coleira que monitora os níveis de ruminação, cio e conforto das vacas, os irmãos e sócios Thiago e Leonardo Guedes Martins tinham por hábito conferir periodicamente gráficos dos animais monitorados.
Quando percebiam alguma alteração, como o cio, enviavam por WhatsApp uma mensagem ao cliente. A intenção era estimular o criador a ficar de olho no sistema e, de certa forma, convencê-lo de que a C-Tech funcionava:
– O feedback foi muito positivo. Quando a gente avisava o cliente de algo que ele não tinha visto e, com isso, iria evitar um grande prejuízo, como os sinais de uma doença ou proporcionar a fertilização na hora certa, no caso do cio, ele manifestava uma gratidão enorme. Aí, vimos que talvez eles não estivessem totalmente adaptados ao hábito de, a cada ordenha, conferir as informações coletadas pela coleira – explica Thiago.
– Isso gerou um extenso debate dentro da empresa. Mas a valorização que partiu dos clientes, que passaram a ver o retorno ao investimento que tinham feito, nos motivou a pôr o plano de saúde em prática como um serviço. Agora, temos uma equipe dedicada a esse monitoramento – conta Guedes.
Agora, a cada ordenha em alguma das fazendas com o sistema criado pela Chip Inside, inclusive fora do Brasil, haverá um colaborador da empresa conferindo os níveis de ruminação e ócio das vacas. Ao fim da conferência, ele envia uma mensagem de texto ao produtor e ao veterinário da fazenda com o relatório.
Longe de substituir o trabalho do profissional, as informações mostram o que verificar e quais vacas precisam de atenção na próxima visita.
Retomada
Embora fosse indiscutível entre pequenos e grandes produtores o ganho em produtividade possibilitado pelo sistema da empresa, o valor do investimento inicial com a compra das coleiras, equipamentos e software de monitoramento do rebanho acabava excluindo do mercado as fazendas menores.
Diante do pedido de alguns criadores da oportunidade de testar antes de adquirir o material, Thiago e Guedes se viram diante de outra decisão e optaram, mais uma vez, por apostar.
Agora, o produtor pode locar o sistema em comodato, em planos que vão de R$ 18,90 a R$ 45,90 por coleira, com fidelidade de seis meses. No final do período, o cliente escolhe se segue no aluguel, adquire o sistema, abatendo do valor o que já foi pago, ou interrompe o uso.
– Ficou atrativo para o pequeno produtor, que tem 20, 30 vacas. Ele pode alugar 10 coleiras e monitorar um grupo a cada 100 dias, por exemplo, e vai ter uma boa amostra do rebanho – explica Thiago.
Como Funciona
– Cada vaca ganha uma coleira, que fica presa ao pescoço durante todo o tempo
– A cada hora, o aparelho identifica quanto tempo por dia a vaca dedica à ruminação (mastigação durante a digestão do pasto), ao ócio e à atividade (como caminhar e pastar)
– A cada ordenha, os animais passam pelas antenas que coletam os dados de cada coleira e transferem para o software de monitoramento do rebanho
– O programa gera gráficos e identifica padrões para cada animal
– Assim, é possível perceber quando o comportamento da vaca sai do padrão. Se está ruminando menos e diminuiu a atividade, pode ser sinal de que uma doença está chegando. Identificada nessa fase, antes dos sintomas, é possível ainda trabalhar na prevenção
– Esses dados ficam disponíveis para o produtor que comprou ou alugou o sistema, mas as informações também são monitoradas pela equipe da Chip Inside, que envia mensagens por WhatsApp para o cliente e para o veterinário da propriedade
– Quem opta pelo aluguel recebe, também, o serviço do plano de saúde
– A locação tem planos a partir de R$ 18,90 por animal por mês, com fidelidade de seis meses. No final do período, é possível seguir com o plano, adquirir o sistema com o abatimento do valor pago mensalmente ou interromper o uso
Ferramenta que ajuda o criador a cumprir metas
Quando ficou sabendo da criação de um sistema que monitorava em tempo real o comportamento bovino, o agropecuarista Elídio Pereira Xavier, de São Vicente do Sul, já tinha o hábito de registrar nas agendas o máximo de informações observadas por ele e pelos peões sobre cada uma das vacas da fazenda Santo Ignacio.
Aos 82 anos, o produtor rural é entusiasta da tecnologia, embora prefira deixar o trabalho diante do computador à filha.
Desde dezembro, as vacas de leite da propriedade, que também tem bovinos de corte e lavoura de soja, estão sendo monitoradas pelo sistema da Chip Inside. Por enquanto, produto e serviço estão em teste, mas parece faltar pouco para a decisão:
– Mais uma ou duas prenhezes que forem confirmadas com a ajuda das coleiras já vão mostrar que vale a pena. A detecção do cio na vaca holandesa é difícil, e temos poucas horas para a inseminação. Então, a nossa ideia é reduzir o tempo entre uma prenhez e outra, aumentando a produtividade – explica.
Hoje, são 80 vacas na ordenha, o que corresponde a cerca de 70% dos animais adultos do rebanho. O ideal para Xavier era aumentar o índice para 85%, o que só será alcançado se o tempo entre o nascimento do bezerro e o começo de uma nova gestação cair pela metade, de 90 para 45 dias.
O resultado que o monitoramento já deu é a possibilidade de detectar o cio das vacas à noite ou de madrugada, o que possibilita que a inseminação seja feita assim que os dados chegam para a equipe da fazenda.
– A vaca fica até 12 horas no cio. Muitas vezes, ele começa à tardinha, após a ordenha da tarde e, na próxima, às vezes não conseguimos mais identificar o cio visualmente, mas, com o diagnóstico do sistema, de manhã conseguimos inseminar – diz a filha Denise Vianna Xavier.
Prevenção a infecções
As coleiras estão, atualmente, em 40 vacas da fazenda e deve haver um revezamento. Além do cio, já foi possível evitar o uso de antibióticos com a detecção precoce de problemas que resultariam em infecções. Sabendo antes, os criadores puderam administrar homeopatias e prevenir a doença.
Além do mal estar do animal e o custo elevado, o antibiótico implica no descarte do leite por mais quatro dias após o tratamento.
– Eu sou química, e o pai é advogado de formação, por isso nos cercamos de profissionais da área técnica. Na lavoura, há anos temos o recurso da agricultura de precisão, com o monitoramento a distância da irrigação. Agora, apareceu algo semelhante para o gado leiteiro – comenta Denise.
Fonte: Zero Hora