No final de 2014, a economia emitia os primeiros sinais de crise. Hoje, o país atravessa uma forte crise econômica e política, com empresas fechando, desemprego subindo e bolsos vazios.
- Mas é Natal. Tempo de esperança, e o brasileiro deve gastar menos e procurar alimentos e bebidas a preços mais acessíveis, mas jamais vai deixar de comemorar – diz Domingos Martins, presidente do Sindicato das Indústrias de Produtos Agrícolas do Estado do Paraná (Sindiavipar), que representa 43 empresas.
Segundo ele, o frango será o preferido nas mesas, por conta de estar mais barato em relação às outras carnes.
- Nossa expectativa é de um crescimento de 4% a 5% nos negócios com a ave em comparação com o último Natal – afirma.
E, para acompanhar o frango, nada como uma boa cervejinha, uma opção mais barata que os vinhos. Pesquisas da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) preveem incremento de venda de 4,2% neste fim de ano comparando-se 2014 com 2015. O motivo é o mesmo do frango: preço. No caso do vinho importado, a desvalorização do real em relação ao dólar o torna mais caro (24,3% nos últimos 12 meses). Num compasso mais lento, o vinho nacional também subiu, informa a Abras, acrescentando quebacalhau, frutas secas e champanhe ficaram um pouco mais distantes do poder de compra das famílias.
Bem cotado no ranking de comercialização está também o panetone, que pega carona na crise. É que alguns produtos típicos de Natal, como ele, devem virar lembrança e substituir presentes mais caros como roupas e eletrodomésticos. Empresas como a tradicional Bauducco aceleram a produção, apostando que o panetone possa ser o presente principal das festas. A Bauducco deve incrementar a oferta em 10% neste ano, colocando nas gôndolas 75 milhões de unidades.
No total, somando-se todos os itens de alimentação, a Abras considera otimista a projeção de incremento de 0,4% nas vendas natalinas constatada na pesquisa com os supermercadistas. É a variação percentual esperada de 2015 para 2014. No ano passado, as vendas em dezembro cresceram 2,94% em relação a dezembro de 2013.
- Levando-se em conta o momento difícil da economia brasileira, o índice de 0,4% nos deixa satisfeito. A tradição irá impulsionar o consumo nos supermercados – observa Sussumu Honda, presidente do conselho consultivo da Abras.
Alinhado com Sussumu, Fernando Yamada, presidente da Abras, completa:
- Temos investido muito em pesquisa sobre o gosto e a preferência dos clientes. Montamos uma agenda positiva e, no caso específico do Natal, quando a tradição dá o tom, fica mais fácil negociar – afirmou.
Segundo Yamada, o “casamento perfeito” neste Natal é o do frango com a cerveja, principalmente a premium, em franca expansão. Tanto Honda como Yamada admitem que o cenário de desemprego, a queda de renda e o câmbio são fatores limitantes.
Além da Abras, Globo Rural contatou grandes empresas, como a JBS e a Aurora, entidades como o Sindicato das Indústrias de Laticínios do Paraná (Sindiavipar), Estado que mais produz frangos, a Associação Paulista dos Criadores de Ovinos (Aspaco), a Associação Catarinense de Avicultura (aves, inclusive perus) e analistas, como Hyberville Neto, da Scot Consultoria, de Bebedouro (SP).
Domingos Martins, do Sindiavipar, explica a razão que o leva a acreditar que a carne de frango vai vender mais que a de boi, de suíno e de ovino. Segundo ele, 1 quilo de frango no supermercado sai a R$ 6, enquanto o temperado vai a R$ 8.
A reportagem visitou seis pontos de vendas na cidade de São Paulo e constatou que as cotações dos concorrentes realmente ficam acima. O motivo que torna o frango mais barato, explica Martins, é a eficiência na engorda – hoje, a ave fica pronta em, no máximo, 45 dias e é distribuída para todo o país, não só para nichos.
- As taxas de desemprego em alta, a inflação corroendo os salários e os preços da carne vermelha valorizados geram diminuição da demanda e migração para as proteínas alternativas, com destaque para o frango, cuja competitividade frente à carne bovina tem estado em alta ao longo de 2015 – confirma Hyberville Neto.
Churrasco em alta
Mas as empresas de carne e os criadores de ovinos, bovinos e suínos também apostam suas fichas no Natal. Eles não acreditam que as vendas irão arrefecer.
- É uma tradição milenar – afirmou.
Caso da JBS, que montou uma estratégia e foi auxiliada pelo calendário. É que tanto o Natal quanto o Ano-Novoacontecem em finais de semana.
- A demanda por churrasco deverá crescer de 20% a 30% – confia Waldir Cicerelle, gerente executivo comercial da empresa.
É um número robusto em tempos de cintos apertados e de retração no consumo de carne bovina, mas há uma explicação.
- O churrasco em família é o que melhor traduz o espírito de confraternização do período. E mais: há opção de consumir desde a picanha, um pouco mais cara, até o contra-filé, o cochão mole e a alcatra, que pesam menos no bolso do brasileiro – afirma Cicerelle.
- Nossa visão do Natal e do Ano-Novo é bastante positiva – afirma Cicerelle, lembrando ainda que a Seara, empresa da JBS, vai incrementar também a oferta de aves e suínos.
Segundo ele, o volume deve aumentar em relação a 2014.
Nesse cenário de importados a preços altos – além dos vinhos, o Brasil compra alimentos lá fora –, a Cooperativa Aurora, de Chapecó (SC), adianta que trabalha com uma linha específica de final de ano. São suínos temperados, pernil in natura e frangos temperados.
- O mercado de São Paulo é um consumidor ávido de nossos produtos. É inegável que as carnes de frango puxam o comboio de negócios neste Natal, pois a carne bovina está bem mais cara – diz Leomar Luiz Somensi, diretor comercial da Aurora baseado na cidade de São Paulo há 12 anos.
Ele comanda as estratégias de vendas no Estado. Em sua previsão, em quantidade, as aves alçam voos mais altos. O mercado absorve de 4% a 5% mais que em 2014. Já a receita pode ficar um pouco abaixo. As previsões são de Somensi.
De seu lado, os criadores de ovinos acreditam que a mística prevalece.
- O brasileiro evoca o simbolismo, e o consumo de carne de cordeiros historicamente dá um salto de 40% a 50%. Este ano não será diferente – afirma Bruno Garcia, presidente da Associação Paulista dos Criadores de Ovinos, de São Manoel (SP).
Segundo Garcia, para dar resposta à demanda. Ela é mais forte ainda no Ano-Novo, torna-se necessário importar ovinos em pé e carne do vizinho Uruguai, já que no Brasil é grande a diferença entre a produção nacional de carne de cordeiro e o volume consumido. Garcia acredita que não será preciso traçar estratégias para a comercialização de ovinos no Natal.
- É difícil suprir os pedidos do mercado. Sempre é assim, o que nos obriga a comprar lá fora – diz.
Outro fator a empurrar à frente o mercado de carne de cordeiro é que o consumo, principalmente em São Paulo, é limitado a nichos mais sofisticados. Expandiu-se nos últimos anos graças à melhora no poder de compra da população, o que a tornou ainda mais exígua.
- Datas comemorativas como essas fazem aumentar, consideravelmente, a demanda pela carne de cordeiro que produzimos. Isso nos estimula a desenvolver uma campanha especial com a oferta de pernil, paleta e cordeiro – falou.
Quem fala é Valdomiro Polizelli Júnior, da paulista VPJ Agropecuária, uma das grandes produtoras de carne nobre. Polizelli afirma ainda que caprichou neste Natal e está vendendo somente carne de animais abatidos ainda jovens.
O capricho, explica o fazendeiro, é porque ele acredita que, no fim do ano, consumidores tradicionais de carne bovina costumam aderir aos cortes de cordeiro por conta dos investimentos no sabor e maciez.
O mesmo vale para o peru, outro símbolo do Natal. A ave fica ausente das mesas durante a maior parte do ano, mas ressurge com força ao final dele e é protagonista das clássicas fotos que reúnem a família sorridente ao redor das mesas repletas. A pesquisa da Abras indica que a venda vai cair, mas Ricardo de Gouvea, diretor executivo da Associação Catarinense de Avicultura (Acav), não concorda. Ele estima que os negócios com peru devem crescer sim (Gouvea não tem números) neste final de ano em relação a 2014. O Estado de Santa Catarina é o maior produtor desse tipo de ave, com cerca de 40% do mercado. O consumo per capita de carne de peru no Brasil é pequeno: 1 quilo. O de bovinos e de frangos supera os 40 quilos.
Pensou Natal, pensou no peru à mesa, pontua Gouvea. Na ocasião, ele estava preocupado com a greve dos caminhoneiros e o transporte dos produtos oriundos do sul do país. Em meados do mês passado, a paralisação perdeu fôlego.
Campos de Guarapuava
O mercado cervejeiro cresce no país e agita o Paraná, particularmente no Natal. A Ambev e o Grupo Petrópolis, entre outras empresas, abrem fábricas por lá e animam os produtores. A maior parte da cevada tem por destino a maltaria da Cooperativa Agrária de Guarapuava. Ela preferiu não divulgar números da produção total e especificamente para este Natal.
Globo Rural apurou que a maltaria da Agrária deve aumentar a produção de 220.000 toneladas ao ano para cerca de 350.000 toneladas em 2016. Constatou que a agitação no campo e na cidade é grande para o Natal da cerveja.
Fonte: Globo Rural